Direitos Humanos

23 de maio de 2024 - quinta

“Gritos preconceituosos são vozes que agridem e torturam”, diz Silvia Souza em abertura da IX CIDH

Presidente da Comissão Nacional de Direitos Humanos, da OAB Nacional, pontua a importância de Campinas sediar o evento

Na cidade de Luiz Gama, líder abolicionista dos advogados, Silvia Souza abre a IX Conferência Internacional de Direitos Humanos. Foto: Mateus Sales/OAB SP


“Gritos preconceituosos são vozes que agridem e torturam a todo instante um de nós ou um dos nossos”, reverberou a presidente da Comissão Nacional de Direitos Humanos (CNDH) do Conselho Federal da OAB, Silvia Souza, em um discurso emocionado, na abertura da IX Conferência Internacional de Direitos Humanos. No auditório da Expo D. Pedro, em Campinas (SP), a plateia – composta por especialistas, entidades governamentais, organizações não governamentais e outras entidades que atuam na defesa dos direitos humanos no Brasil e no exterior – presenciou uma série de discursos contra o ódio e os preconceitos. Silvia relatou que muitas pessoas se aproveitam, inclusive, da clandestinidade da internet para agredir a quem julgam inferiores.

“Escondidos na clandestinidade perversa das desigualdades, protegidos em suas casas ou atrás de telas, desdenham dos direitos humanos, deturpando a sua essência, a fim de alienar e confundir aqueles que não podem prescindir de sua defesa”, lamentou. Dessa forma, a primeira mulher, e negra, a presidir a Comissão na OAB Nacional abriu a Conferência, promovida pelo CFOAB, com o tema central “Democracia, pluralidades e o princípio do não retrocesso”.

Ela pontuou a importância de a cidade paulista sediar o evento: “Campinas foi terra de passagem para Luiz Gama. Em meados de 1840-1850 aqui viveu o maior abolicionista dos advogados, ainda na condição de escravo doméstico, onde aprendeu a ler  e escrever até que pode, aos 17 anos, reivindicar o seu direito à liberdade”, explicou.

“Esse, portanto, é um lugar simbólico para um momento histórico, afinal, esta é a nona Conferência, porém, é a primeira que ocorre sob a presidência de uma mulher na CNDH. Sim, eu sou a primeira mulher a presidir a Comissão Nacional de Direitos Humanos e, além de ser mulher, sou uma pessoa negra. Fazendo com que essa gestão seja, portanto, disruptiva e paradigmática em dois aspectos: raça e gênero”, completou Silvia.

A presidente da Comissão Nacional de Direitos Humanos foi muito aplaudida ao dizer que, apesar de ser “herdeira do espólio da escravidão,  filha de uma dinastia de mulheres trabalhadoras domésticas”, é uma mulher livre, advogada, conselheira federal pela seccional SP e presidente de uma das comissões mais importante do Sistema OAB.

“E através da minha voz, aqui, também falam as vozes de quem nos possibilitou chegar até aqui. É a voz das pessoas perseguidas e assassinadas por ousarem expressar suas identidades, é a voz de defensoras e defensores de direitos humanos emboscados e assassinados em razão de um ideal, enfim, é a voz e de tanta gente que ficou por esses séculos vítimas da atrocidade, da brutalidade, da inclemência e do sadismo do sistema”, destacou, homenageando Esperança Garcia, primeira advogada brasileira, e negra, além de Dandara, Zumbi, Luiza Mahin, Aqualtune, Mãe Bernadete, Cacique Raoni, Davi Kopenawa, Sonia Ará Mirim, Gabriel Sales Pimenta, Doroty Staim, Bruno Pereira, Salvador Allende e tantas outras pessoas.

Comissão de Direitos Humanos

Sílvia Virgínia aproveitou a ocasião para lembrar que ao longo desses quase três anos foram muitos os desafios vencidos em defesa dos direitos humanos. Entre os casos citados, ela relembrou que o colegiado esteve junto ao povo pataxó e han-han do território da Coroa Vermelha no sul da Bahia, onde dois adolescentes indígenas foram assassinados por grileiros por defenderem suas terras.

A presidente da Comissão Nacional de Direitos Humanos (CNDH) do Conselho Federal da OAB, destacas os trabalhos desevolvidos pela comissão em todo o país. Foto: Mateus Sales/OAB SP

Também citou que atuou na Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH), na qualidade de amicus curiae, juntamente com o Centro pela Justiça e o Direito Internacional (Cejil), para apresentar contribuições para o julgamento do assassinato do advogado Gabriel Sales, ocorrido há mais de 40 anos.

Ela ainda falou que a Comissão Nacional esteve junto com a OAB Roraima, inclusive presencial, no caso do povo yanomami,  que originou o ingresso do CFOAB como amicus curiae na Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 709 que trata, entre outros aspectos, da saúde do povo indígena. E, por provocação da Coalizão Negra por Direitos e com a anuência do CFOAB, ingressou na ADPF 973 no Supremo Tribunal Federal (STF), que  busca o reconhecimento do "estado de coisas inconstitucional da população negra" caracterizado por sua alta letalidade em razão do racismo.

A atuação Comissão também foi importante após o desastre de afundamento de parte da cidade de Maceió (AL). Ela atuou em conjunto com a OAB Alagoas e com o Conselho Nacional de Direitos Humanos no caso Braskem. E atualmente, por meio de um grupo de trabalho, tem apoiado as ações da OAB Nacional e da OAB-RS, em razão das enchentes no Rio Grande do Sul.

“Sabemos, no entanto, que apenas essa Comissão, ou mesmo o Sistema OAB com toda a sua grandeza, não é capaz de dar vazão às milhões de violações de direitos de toda espécie que ocorrem cotidianamente neste país”, afirmou, conclamando que os demais atores também contribuam para que se possa avançar no tema direitos humanos e não retroagir.

“Não se tem dúvida, portanto, de que a palavra-chave para transformar o mundo atende pelo nome direitos humanos”, finalizou.

Texto: OAB Nacional


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