Mulheres Advogadas

19 de abril de 2024 - sexta

Em Genebra, advogada brasileira propõe criação de ODS para igualdade racial

Ana Carolina Lourenço representou Comissão das Mulheres Advogadas da OAB SP, em Fórum das Nações Unidas

Ana Carolina Lourenço, em Genebra, pouco antes de sua fala no 3º Fórum Permanente de Pessoas Afrodescendentes. Foto: OAB SP/Divulgação



Nesta quinta-feira (19), Ana Carolina Lourenço, vice-presidente da Comissão das Mulheres Advogadas da OAB SP, discursou no 3º Fórum Permanente de Pessoas Afrodescendentes, iniciativa da ONU realizada em Genebra, na Suíça. Reconhecida como liderança negra no Brasil, a advogada falou durante o quarto painel, que teve como tema “A Segunda Década Internacional para os Afrodescendentes: Combate ao Racismo Sistêmico, Justiça Reparadora e Desenvolvimento Sustentável”.

“Que seja indicada a criação de um ODS [Objetivos de Desenvolvimento Sustentável] que tenha incidência exclusivamente na igualdade racial. Seja recomendado aos países um monitoramento e prestação de contas transparente e eficaz sobre o alcance das metas e políticas públicas que tocam as pessoas afrodescendentes compartilhados neste fórum”, sugeriu a advogada. Propôs, ainda, a adoção de cotas raciais para cargos de tomada de decisão na ONU, para que o debate sobre raça, cor e etnia seja transversal no órgão.

Lourenço pediu urgência para tais questões. “Precisamos de intencionalidade, especificidade e investimento para alcançarmos uma equidade racial agora, não só no futuro. Não sabemos quantos estarão vivos para contar a história aos que sobreviveram”, ressaltou.

O 3º Fórum Permanente de Pessoas Afrodescendentes ocorreu entre 16 e 19 de abril em Genebra. O evento, organizado pela United Nations of Human Rights, reuniu lideranças mundiais para debater essa luta. Ana Carolina Lourenço foi convidada como liderança negra no Brasil e representante da OAB SP nesta edição do Fórum. Ao longo da semana ocorreram quatro painéis: “Reparações, Desenvolvimento Sustentável e Justiça Econômica”; “Educação: Superando o Racismo Sistêmico e os Danos Históricos”; “Cultura e Reconhecimento”; e “A Segunda Década Internacional dos Afrodescendentes: Expectativas e Desafios”.

Dione Almeida, diretora secretária-geral adjunta da OAB SP e responsável por incentivar a paridade de gênero e raça na Ordem paulista, celebra a participação da Comissão Estadual das Mulheres Advogadas em um Fórum de relevância global, baseado em ações firmadas pela ONU “Gênero e raça nos colocam em situação de desvantagem”, afirma. “Enquanto entidade de classe, lutamos todos os dias pelos direitos e oportunidades das pessoas pretas. Mas, o caminho ainda é longo. A paridade de gênero e raça, dentro e fora da nossa instituição, ainda é um objetivo e, infelizmente, não uma realidade”, finaliza a diretora. 
         
Ações firmadas pela OAB SP    
  
Em cumprimento às bandeiras levantadas pela direção da Ordem paulista, Dione Almeida e Ana Carolina Lourenço destacaram algumas das iniciativas criadas pela OAB SP nos últimos anos, com o intuito de proteger as raízes afrodescendentes na advocacia paulista.

A primeira delas é o Quinto Constitucional, que acompanha, zela e promove a representativa nos processos de escolha de advogados e advogadas que ocupam cargos no Poder Judiciário.

Há, também, a obrigatoriedade de criação de Comissões de Igualdade Racial em todas as subseções do Estado e a criação das medalhas “Esperança Garcia”, que reconhece o trabalho de advogadas em defesa da Justiça e dos Direitos Humanos, e “Tereza Benguela”, que homenageia advogadas negras que contribuíram para a história da entidade em prol da justiça e igualdade.

“Nós vivemos e lutamos em prol dessa causa todos os dias, como advogadas e mulheres negras. Agora, ter a oportunidade de refletir e aprender sobre o tema em escalas ainda maiores, com profissionais do mundo todo, é inexplicável. Estarei em Genebra por mim e por toda a advocacia paulista negra”, conclui Ana Carolina Lourenço. 

Leia o discurso na íntegra:

Boa tarde a todos, todas e todes.

Sou Ana Carolina Lourenço, mulher negra, cis, visto roupas com tonalidades rosas e tranças loiras.

Faço minha audiodescrição para que este fórum seja mais acessível.

Sou uma das mais jovens conselheiras da Ordem dos Advogados do Brasil, Secional São Paulo, com mais de 500 mil pessoas inscritas na ordem.

Salve Dandara, Esperança Garcia, Sueli Carneiro e Deise Benedito.

Antes de fazer minhas propostas, pergunto. Se os ODS [Objetivos de Desenvolvimento Sustentável] não forem cumpridos até 2030, o que vai acontecer?

Estamos aqui porque a conferência de Durban não foi cumprida, e a primeira década foi insuficiente.

Então, proponho que o debate sobre raça, cor e etnia seja transversal a todos os órgãos da ONU. Proponho também que seja implementada cotas raciais na ONU, nos cargos de tomada de decisão.

Que seja indicada a criação de um ODS que tenha incidência exclusivamente na igualdade racial. Seja recomendado aos países um monitoramento e prestação de contas transparente e eficaz sobre o alcance das metas e políticas públicas que tocam as pessoas afrodescendentes compartilhados neste fórum.

Dentro das indicações, que conste de forma explícita o papel da iniciativa privada para além do que está sendo discutido no Pacto Global sobre o papel de reparação histórica e justiça reparadora.

Agradeço a oportunidade de dialogar para construir hoje um mundo de paz que está em guerra contra as pessoas negras por sermos apenas quem somos.

Precisamos de intencionalidade, especificidade e investimento para alcançarmos uma equidade racial agora, não só no futuro.

Não sabemos quantos estarão vivos para contar a história aos que sobreviveram, e recomendarmos a eles para continuarem correndo.

Sou jovem, tenho pressa. Quero viver com dignidade, igualdade de oportunidade e resultados.

Não quero lutar para sempre. Quero viver bem, plenamente, feliz e brilhar.

Como diz Emicida, “é tudo para ontem”.

 


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