O Bom Juiz-Poeta
Levi Carneiro
Em agosto de 1937, a Academia Brasileira de Letras abriu as suas portas
para receber Levi Carneiro. Um advogado, exclusivamente um advogado,
como escreveu Ernesto Leme. Naquela ocasião, seu chefe incontestável. O
organizador da profissão. O idealizador da Federação dos Institutos
Regionais. O criador da Ordem dos Advogados do Brasil.
Na sua posse, no pequeno Trianon, proclamou: “Se tivesse de
ceder à tradição maliciosa, que me obrigaria a justificar-vos o
haverdes elegido, somente poderia dizer-vos que em mim honrastes todos
os que, na minha profissão, procuram conciliar a atividade profissional
com o trato das idéias e das doutrinas”.
Realçou o sacerdócio da advocacia “na sua beleza, na sua força
nas suas aflições; no que comporta de lealdade, abnegação,
desinteresse; no que proporciona de independência, no que ensina de
tolerância”.
Faltou dizer – completa Ernesto Leme – o quanto exige, para
ser fiel e eficientemente exercida, do conhecimento da língua.
Mostrando que ela requer devotamento de todas as horas, de toda a vida,
Levi Carneiro a definiu: “Profissão em que me vou consumido...”.
Teria naquela altura já visitado a Holanda o notável advogado?
“Mais tarde foi juiz na Corte de Haia.
Entre guias de viagem, não dispensou ele por certo os
‘souvenirs’ de Route, de Henri Barboux, duplamente colega, advogado e
acadêmico.
E indo a Amsterdã saudar Spinoza e admirar Rembrandt, sem
dúvida procurou o pequenino quadro maravilhoso e sugestivo da antiga
Galeria Six.
Anotaram-no assim as recordações citadas: um homem, de pé,
contempla com meditadora atenção, vela a arder, em cima da mesa. A luz
jorra, de certo modo, da obscuridade. Lêem-se essas profundas e
melancólicas palavras: ‘Aliis in serviendo consumor’ (eu me consumo ao
serviço dos outros).
Não poderia exprimir de forma mais característica e melhor o que é advocacia. É divisa lapidar. Está ali o advogado.
No seu discurso na Academia, discorrendo sobre a advocacia,
frisou Levi Carneiro: “Profissão em que me vou consumindo”... ao
serviço dos outros.
O advogado serve aos particulares, à Ordem, à Lei, ao Direito.
À Pátria. À Humanidade. E para servir a tudo e a todos, serve
principalmente à língua em que discursa ou fala com apuro, clareza,
correção, elegância e consciência.”