Mais apoio e respeito às pessoas com deficiência
A questão é recorrente: o poder público no Brasil não tem disponibilizado instrumentos e meios para formar uma sólida e verdadeira política de apoio às pessoas com deficiência. Por todos os lados, é visível a precária estrutura de atendimento às pessoas com deficiência. Comecemos pelas condições da infraestrutura urbana, as calçadas, por exemplo. O que se vê nas calçadas de praticamente todas as cidades brasileiras é uma fileira interminável de buracos, alguns convergindo para uma escadaria malfeita e disforme, intransitável para pedestres; apenas 4,7% das vias urbanas no Brasil possuem rampas de acesso para cadeirantes.
No transporte público não é diferente. Há um decreto presidencial que determina: 100% da frota dos coletivos municipais deveria estar adaptada para as pessoas com deficiência a partir de 2 de dezembro de 2014. Mas a realidade é outra: dos 14.702 coletivos em circulação na cidade de São Paulo, 14% não têm itens básicos de acessibilidade. São 2.110 veículos nesse estado. Mesmo adaptados, os elevadores são velhos ou não funcionam.
Esse é apenas um pequeno retrato da absoluta falta de respeito com os portadores de deficiência no Brasil. Por isso, 77% deles se queixam de que seus direitos não são respeitados, segundo pesquisa da Secretaria de Pesquisa e Opinião do Senado Federal. Porém, pior do que vias impróprias ou o péssimo transporte público, o que maltrata mais o princípio da igualdade e da dignidade humana é a muralha do preconceito. Na verdade, ainda hoje a pessoa com deficiência tem de buscar o seu espaço por meio de muita luta, sem lágrima ou piedade – afinal, é seu direito e um dever do poder público.
Neste dia 21 de setembro comemora-se o Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência, instituído por iniciativa de movimentos sociais em 1982 e oficializado pela Lei Nº 11.133/2005. A data foi escolhida para coincidir com o Dia da Árvore e representa o nascimento das reivindicações de cidadania e participação em igualdade de condições.
Em 2008, o Brasil ratificou a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, adotada pela Organização das Nações Unidas (ONU) e o Protocolo Facultativo, documento que obteve aqui equivalência de emenda constitucional. Da convenção, surgiu a Lei Brasileira de Inclusão (LBI), de janeiro de 2015. Seu objetivo é garantir direitos nas áreas de saúde, educação, trabalho e infraestrutura para pessoas com deficiência. É um indiscutível avanço civilizatório na rotina da sociedade republicana e democrática em que, acreditamos, todos os brasileiros queiram viver. E, mais do que atender a público restrito, essa normatização atende a um vasto universo estimado em 45,6 milhões de pessoas, ou quase 24% da população brasileira.
A Secional paulista da OAB entende que promover a inclusão faz parte de seu papel de guardiã da cidadania. Ciente de que parcela da população precisa conhecer o que o aparato jurídico lhe oferece, nossa instituição tem se empenhado em ampliar e monitorar a aplicação da LBI, promovendo ações de divulgação desse diploma legal. São 127 artigos que impõem obrigações ao poder público e à iniciativa privada.
Difundir esse conhecimento é a melhor forma de espraiar a cultura de acessibilidade para todos. Sem discriminação e em prol de uma convivência mais justa e harmoniosa. O plano de trabalho da OAB SP tem sido o de incentivar discussões, debates, seminários temáticos, criar comissões, divulgar trabalhos e estudos, patrocinar eventos e workshops dando maior visibilidade à LBI e às suas aplicações práticas.
Além da legislação, a causa da pessoa com deficiência também precisa ter a sua visibilidade reforçada, o que foi incentivado pela campanha Inclusão+, levando a mensagem para o grande público por meio de ações no intervalo de clássicos das equipes paulistas de futebol e ainda em peças publicitárias distribuídas nas mais de 200 Subseções da instituição em todo o Estado.
Outra ação da Ordem paulista foi promover a pesquisa que resultou no ranking de acessibilidade do litoral paulista, anunciado em setembro de 2016. Foram avaliados 11 itens em 223 praias do Estado, entre os quais estão os percursos devidamente sinalizados, a disponibilidade de cadeiras de rodas anfíbias, a presença de apoiadores, as vagas exclusivas e a clareza de informações acessíveis entre outros itens. O levantamento foi elaborado por intermédio da ajuda de 12 Subseções da entidade.
Apesar dos obstáculos, a legislação brasileira procura amparar a pessoa com deficiência. Por exemplo, a Lei de Cotas, de 1991, obriga empresas com cem ou mais funcionários a preencher de 2% a 5% dos seus cargos para pessoas com deficiência. Ainda não é plenamente respeitada, pois só no ano passado foram mais de 4,5 mil autuações. Os argumentos mais usados por quem não cumpre a lei são o alto custo para adaptar o ambiente de trabalho e a falta de qualificação profissional.
Hoje temos 9,3 milhões de pessoas com deficiência que se encaixam na Lei de Cotas, para 827 mil vagas abertas, o que significa que há gente para entrar no mercado de trabalho. Mas é preciso se qualificar profissionalmente para se candidatar a essas vagas. Ou seja, o Brasil tem uma legislação avançada, mas os obstáculos ainda são enormes, especialmente quando nos deparamos com o preconceito, situação que só diminuirá com mais informação e cultura. Passo a passo, constrói-se esse árduo caminho. Nossa missão é a de aprimorar e alargar o percurso. Há avanços visíveis, e muito ainda a se fazer.
Marcos da Costa
Presidente da OAB SP