E-4.239/2013


EXERCÍCIO PROFISSIONAL - INSCRIÇÃO SUPLEMENTAR - OBRIGATORIEDADE - PRÁTICA DE ATIVIDADES PRIVATIVAS DA ADVOCACIA EM TERRITÓRIO DE OUTRO CONSELHO SECCCIONAL - HABITUALIDADE - INTERVENÇÃO JUDICIAL EM CINCO OU MAIS CAUSAS NO PERÍODO DE UM ANO - CRITÉRIO OBJETIVO - FEITOS ARQUIVADOS.

É obrigado à inscrição suplementar no Conselho Seccional da OAB o advogado que, no território deste Conselho, praticar, em mais de cinco causas distintas, no mesmo ano civil, as atividades privativas previstas no inciso I do Art. 1º do Estatuto. O número de causas é critério objetivo, que não admite flexibilidade e que alcança os feitos arquivados (provisória ou definitivamente) naquele ano. Não se faz necessária a inscrição suplementar para atuação em Tribunais Superiores e Tribunais Regionais Federais, inclusive para feitos de sua competência originária, se o advogado está inscrito em um dos Conselhos Seccionais da OAB abrangidos pela jurisdição atribuída ao órgão. Proc. E-4.239/2013 - v.u., em 18/04/2013, do parecer e ementa do Rel. Dr. FÁBIO TEIXEIRA OZI - Rev. Dr. FÁBIO GUIMARÃES CORRÊA MEYER - Presidente Dr. CARLOS JOSÉ SANTOS DA SILVA.

RELATÓRIO – A Consulente, regularmente inscrita nos quadros da OAB/SP, dirige consulta a esta Turma Deontológica nos seguintes termos:

“1 – Com relação ao número de processos que o advogado pode ter fora da Seccional em que é inscrito, obedece ao critério rigoroso de 5 processos ou esse número pode ser um pouco flexível?

2 – Como é o critério para análise da atuação fora da Seccional, devem ser considerados todos os processos, inclusive os arquivados?

3 – Para caracterizar infração, devo considerar somente processos ativos?”

PARECER – Análise prévia da viabilidade da consulta:

Conheço da consulta, pois, nos termos dos arts. 49 do Código de Ética e Disciplina e 134 do Regimento Interno desta Seccional, compete à Turma Deontológica responder dúvidas sobre temas relacionados à conduta ética no exercício da advocacia, orientando e aconselhando os inscritos na Ordem.

E, muito embora o objeto da consulta não seja propriamente um tema afeto à ética profissional do advogado, mas sim ao exercício da profissão, é oportuno relembrar a Resolução nº 04/93, editada por esta Turma ainda sob a égide do Estatuto anterior, que estabeleceu:

"O ato omissivo do advogado de não proceder a comunicação à Seção da OAB – diferente daquela da sua inscrição principal – onde vier a exercer provisoriamente a advocacia até cinco causas por ano (art. 56, § 2º do Provimento 51/81) ou de não proceder a inscrição suplementar, quando o número de causas exceder de cinco (art. 55, parágrafo único), embora não represente infração ética profissional no estrito sentido deontológico, por falta de específica tipificação no respectivo código, importa, entretanto, em quebra do dever profissional (art. 87, inc. VI do Estatuto), constituindo, assim, infração disciplinar prevista no art. 103, inc. XXIX, do mesmo Estatuto - Lei n. 4.215/63), que impede ao advogado faltar a qualquer dever imposto nesta lei (art. 87), a despeito de não causar dano de qualquer espécie a parte constituinte ou assistida, de conformidade com a remansosa jurisprudência dos tribunais do país".

Assim, nos termos da mencionada Resolução e conforme precedente E-3.953/2010, da relatoria do Dr. Eduardo Teixeira da Silveira, este Relator enfrentará as dúvidas apresentadas pela Consulente.

Mérito:

Pede a Consulente, em síntese, que esta Turma aponte os critérios para a atuação do advogado em território distinto daquele do Conselho Seccional em que tem o seu domicílio profissional e perante o qual deve requerer a sua inscrição.

Pois bem. Como se sabe, o advogado regularmente inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil pode exercer a advocacia em todo o território nacional, como lhe é garantido pelo inciso I, do art. 7º do EOAB.

No entanto, o mesmo EOAB dispõe, no art. 10, caput e §§ 1º e 2º, o seguinte:

Art. 10. A inscrição principal do advogado deve ser feita no Conselho Seccional em cujo território pretende estabelecer o seu domicílio profissional, na forma do regulamento geral.

§ 1º. Considera-se domicílio profissional a sede principal da atividade de advocacia, prevalecendo, na dúvida, o domicílio da pessoa física do advogado.

§ 2º. Além da principal, o advogado deve promover a inscrição suplementar nos Conselhos Seccionais em cujos territórios passar a exercer habitualmente a profissão considerando-se habitualidade a intervenção judicial que exceder de cinco causas por ano.”

Portanto, constata-se que, para o advogado atuar regularmente em território diverso daquele do Conselho Seccional da OAB em que tem seu domicílio profissional e, consequentemente, sua inscrição dita principal, há de ser observado o critério da habitualidade.

Ou seja, o advogado é obrigado a requerer inscrição suplementar caso atue com habitualidade em causas em trâmite no território de outro Conselho Seccional. Essa é a literalidade da norma.

No entanto, para responder plenamente à consulta que foi dirigida a esta Turma, entendo que se faz necessário definir o correto alcance dos termos (i) habitualidade; (ii) intervenção judicial; (iii) causas; e (iv) território, todos constantes do § 2º do art. 10 do EOAB.

No que se refere à habitualidade, o próprio § 2º do art. 10 do EOAB traz, em sua parte final, definição clara sobre esse conceito: considera-se habitual a intervenção judicial em mais de cinco causas por ano.

Desse modo, há, inicialmente, um limite de cinco causas para a configuração da habitualidade que enseja a necessidade de inscrição suplementar perante outro Conselho Seccional da OAB. Observado esse limite, considera-se eventual a atuação do advogado. Superado o limite, a atuação é habitual. Trata-se de critério objetivo.

E aqui, respondendo ao primeiro questionamento da Consulente, esclareço que a norma é rígida, não permitindo qualquer flexibilização quanto ao limite imposto.

Diz o art. 10 claramente que o limite para atuação do advogado é de até cinco causas por ano. Cinco.

Ora, relembrando os ensinamentos de Clóvis Beviláqua “interpretar a lei é revelar o pensamento que anima as suas palavras”. E esse revelar se verifica facilmente no limite imposto pelo § 2º do art. 10.

A norma em questão não dá espaço para interpretação diversa, senão aquela pretendida pelo legislador. Se quisesse ter dito quatro ou seis causas, teria dito. Tendo imposto o limite de cinco causas por ano, é esse número que deve ser observado.

Tanto é assim que o mesmo limite também está imposto no art. 26 do Regulamento Geral do EOAB, segundo o qual “o advogado fica dispensado de comunicar o exercício eventual da profissão, até o total de cinco causas por ano, acima do qual obriga-se à inscrição suplementar”.

Além disso, há outro limite objetivo e determinante para a configuração da habitualidade: o período de “um ano”.

Nesse sentido, o precedente E-3.748/2009, relatado pelo Dr. Cláudio Zalaf, foi preciso ao reconhecer que “a atuação profissional do advogado em seis ou mais ações judiciais, qualquer que seja sua espécie ou ramo do direito material ou processual, dentro do mesmo ano civil deste exercício, abrangidas as novas e as remanescentes de exercícios anteriores e na mesma circunscrição territorial do Conselho Seccional diverso daquele de sua inscrição principal, caracteriza a habitualidade determinada pelo § 2º, do artigo 10, do Estatuto da OAB e art. 26 do Regulamento Geral”.

E o precedente citado foi bastante feliz ao erigir como parâmetro temporal o ano civil que, como estabelece o art. 1º da Lei nº 810/49, corresponde ao “período de doze meses contado do dia do início ao dia e mês correspondentes do ano seguinte”.

Portanto, é habitual a atuação do advogado em mais de cinco causas dentro de um período de doze meses, contado esse prazo a partir da primeira intervenção judicial.

E aqui respondo ao segundo questionamento da Consulente, acerca da inclusão dos processos arquivados no cômputo do limite de causas previsto no § 2º, do artigo 10, do Estatuto da OAB.

Novamente, a lei não faz distinção entre processos ativos ou arquivados (provisória ou definitivamente), não cabendo ao intérprete criar distinções onde não existem.

O limite imposto ao advogado é o de poder patrocinar até cinco causas em um único ano sem precisar de inscrição suplementar, englobando nesse cômputo processos ativos ou arquivados (provisória ou definitivamente), caso o arquivamento tenha ocorrido há menos de um ano.

Disso decorre que, caso um advogado assuma o patrocínio de cinco causas em determinado ano, e uma dessas causas venha a ser arquivada (provisória ou definitivamente), para que não seja necessária a inscrição suplementar deve o advogado aguardar um ano do encerramento daquele patrocínio para então assumir nova causa.

Caracterizada a habitualidade, cabe definir o significado da expressão intervenção judicial. Para ser esta qualificada, basta um mero ato do advogado, ou a intervenção a que alude o dispositivo exige a realização de uma série de atos processuais? Qualquer ato basta, ou se exige a adoção de atos específicos?

A esse respeito, entendo que a resposta se encontra no artigo 5º do Regulamento Geral da EOAB, segundo o qual “considera-se efetivo exercício da atividade de advocacia a participação anual mínima em cinco atos privativos previstos no artigo 1º do Estatuto, em causas ou questões distintas.”

Desse modo, para que se caracterize a intervenção judicial, basta a realização de qualquer das atividades previstas no inciso I do art. 1º do EOAB. E, por conseguinte, para que surja a necessidade de inscrição suplementar perante outra Seccional, basta a realização, pelo advogado, de qualquer dessas atividades em mais de cinco causas distintas.

Feito esse esclarecimento, torna-se necessário examinar o conceito de causa, constante da norma.

Em seus Comentários ao Estatuto da Advocacia e da OAB1, Paulo Lôbo leciona que “causa deve ser entendida como processo judicial efetivamente ajuizado, em que haja participação do advogado. A lei impõe o requisito expresso de ‘intervenção judicial’. Assim, a advocacia preventiva ou extrajudicial independe de inscrição suplementar. Sobre o assunto decidiu o Conselho Federal da OAB que ‘causa é sempre a primeira, sendo irrelevante o acompanhamento nos autos subsequentes. A defesa em processos administrativos, em inquéritos policiais, o ‘visto’ em contratos constitutivos de pessoas jurídicas, a impetração de habeas corpus e o simples cumprimento de cartas precatórias não constituem intervenção judicial para os efeitos do art. 10, § 2º. O recebimento de substabelecimento sem reservas, com assunção de patrocínio da causa, importa em intervenção judicial. Em casos de procuração conjunta, só é caracterizada a intervenção do advogado que, efetivamente, praticar atos judiciais’”.

Causa, pois, é entendido como o processo principal. Incidentes, recursos, processos cautelares que decorrem daquele principal não somam um novo processo, uma nova causa, para fins do disposto no § 2º do art. 10 do EOAB. Ou seja, se o advogado patrocinar uma única demanda no território de outro Conselho Seccional, com inúmeros incidentes e recursos, o limite de atuação em cinco causas por ano não restará atingido por conta destes.

Sobre o tema, importante sublinhar a observação verificada no já citado precedente E-3.953/2010, que reputo como acertada, segundo a qual “embora o Art. 5º do Regulamento Geral do EAOAB se refira à participação do advogado em causas ou questões distintas, a obrigatoriedade da inscrição suplementar, no meu entendimento, se restringe à hipótese de intervenção em cinco causas distintas no período de um ano, e não à intervenção em questões distintas. Isso porque a questão da obrigatoriedade da inscrição suplementar está prevista no § 2º do Art. 10 do Estatuto, específico, que menciona apenas causas distintas. Ademais, o Regulamento da Advocacia não poderia ampliar as hipóteses previstas no Estatuto, que lhe é hierarquicamente superior.”

Por fim, esclarecidos os conceitos de habitualidade, intervenção judicial e causa, cabe buscarmos o significado do termo “território” mencionado no art. 10 do EOAB.

Quanto a esse ponto, respeitadas as posições contrárias, entendo que, quando o art. 10 do EOAB utiliza o termo “território", refere-se não a uma questão geográfica, mas sim a uma questão jurisdicional.

Quando a norma estabelece a necessidade de inscrição suplementar, ela o faz tendo em vista a atuação habitual do advogado em órgãos do Poder Judiciário que não têm jurisdição sobre o território do Conselho Seccional em que aquele advogado está inscrito. Não é, portanto, a localização física de um determinado Tribunal que impõe os limites de atuação habitual, perante aquele órgão, dos advogados não inscritos junto ao respectivo Conselho Seccional.

Melhor explicando: se o advogado inscrito em determinado Conselho Seccional atua de forma habitual perante órgão do Poder Judiciário cuja jurisdição se circunscreve aos limites territoriais de outro Conselho Seccional, deve providenciar inscrição suplementar perante este, em obediência ao § 2º do art. 10 do EOAB.

No entanto, essa regra merece ponderação no que diz respeito aos Tribunais Superiores e aos Tribunais cuja jurisdição excede os limites de um único Estado da Federação, inclusive no que diz respeito às causas de competência originária desses tribunais.

Isso porque, não obstante a Constituição Federal estabeleça, no § 1º do art.  92, que “o Supremo Tribunal Federal, o Conselho Nacional de Justiça e os Tribunais Superiores têm sede na Capital Federal”, o § 2º do mesmo dispositivo constitucional dispõe que “o Supremo Tribunal Federal e os Tribunais Superiores têm jurisdição em todo o território nacional.”

Por outro lado, os Tribunais Regionais Federais foram criados, após a Constituição Federal de 1988, de acordo com a Resolução n.º 1, do extinto Tribunal Federal de Recursos, que estabeleceu:

a) o Tribunal Regional Federal da 1ª Região, com sede em Brasília e jurisdição sobre o Distrito Federal e os estados do Acre, Amapá, Amazonas, Bahia, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Minas Gerais, Pará, Piauí, Rondônia, Roraima e Tocantins;

b) o Tribunal Regional Federal da 2ª Região, com sede na cidade do Rio de Janeiro e jurisdição sobre os Estados do Rio de Janeiro e Espírito Santo;

c) o Tribunal Regional Federal da 3ª Região, com sede na cidade de São Paulo e jurisdição sobre os Estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul;

d) o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, com sede na cidade de Porto Alegre e jurisdição nos Estados do Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina; e

e) o Tribunal Regional Federal da 5ª Região, com sede na cidade de Recife e jurisdição sobre os Estados de Pernambuco, Alagoas, Ceará, Paraíba, Rio Grande do Norte e Sergipe.

Portanto, como se verifica, no que diz respeito aos Tribunais Superiores e aos Tribunais Regionais Federais, o local de suas sedes não representa o limite de sua jurisdição.

Sendo assim, no que diz respeito aos Tribunais Superiores, que têm competência sobre todo o território nacional, entendo que qualquer advogado, inscrito regularmente em qualquer dos Conselhos Seccionais da OAB, poderá atuar naqueles órgãos, em sede recursal ou no âmbito de ações originárias, sem que precise de inscrição suplementar perante o Conselho Seccional do Distrito Federal.

O mesmo se aplica aos Tribunais Regionais Federais que, a despeito de terem sede em um determinado Estado – unicamente pela necessidade de se estabelecer aquele órgão, fisicamente, em algum lugar ‑, não têm jurisdição restrita ao local de sua sede. Nesse caso específico, qualquer advogado, regularmente inscrito em uma das Seccionais da OAB abrangidas pela jurisdição atribuída ao órgão judicial regional, está dispensado da inscrição suplementar para atuação naquele respectivo Tribunal.

Apenas para esclarecer o que expus, proponho um raciocínio: se um advogado inscrito no Conselho Seccional do Mato Grosso do Sul atuar em mais de cinco causas originárias do Tribunal Regional Federal da 3ª Região – que, recorde-se, tem jurisdição sobre São Paulo e Mato Grosso do Sul ‑, terá ele que requerer inscrição suplementar no Conselho Seccional de São Paulo, unicamente pelo fato de que a sede desse tribunal se localiza neste Estado?

A resposta só pode ser negativa, pois o referido Tribunal tem jurisdição sobre o Estado do Mato Grosso do Sul.

Entender de forma diversa, novamente com o devido respeito dos que não se posicionam nesse sentido, representaria indevido benefício aos advogados com inscrição perante Conselhos Seccionais da OAB em cujos territórios se localizam os Tribunais Superiores ou os Tribunais Regionais Federais.

Em suma, a conclusão que chego é de que não se faz necessária a inscrição suplementar nessas hipóteses específicas, inclusive para feitos de competência originária, bastando a inscrição regular do advogado em um dos Conselhos Seccionais da OAB abrangidos pela jurisdição atribuída àquele órgão.

Portanto, observados cada um desses critérios e conceitos extraídos do art. 10 do EOAB, o advogado não incorrerá em quebra de seu dever profissional e nem tampouco em infração disciplinar.

É o parecer que submeto aos meus pares.

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1 – LÔBO, Paulo. Comentários ao Estatuto da Advocacia e da OAB, 5ª ed.: Saraiva, 2009, p. 105.