E-4.465/2015


ATO OU FATO DE TERCEIRO - CONSULTA - NÃO CONHECIMENTO - RESPONSABILIDADE CIVIL E CRIMINAL - CONSULTA - NÃO CONHECIMENTO - RESPONSABILIDADE DISCIPLINAR DE ADVOGADO MANDATÁRIO JUNTAMENTE COM OUTRO COLEGA POR ATO DO COLEGA - RESPONSABILIDADE RESTRITA À CONDUTA (ATIVA OU OMISSIVA) DO CONSULENTE - ORIENTAÇÃO RELATIVA À QUESTÃO CONSULTADA.

Nos termos da Resolução n. 7/95, desta Turma Deontológica, não se conhece de "consultas ou pedidos de orientação sobre atos, fatos, ou conduta relativos ou envolventes de terceiros". Dúvidas sobre direito civil, criminal ou de qualquer outro ramo não podem ser conhecidas por esta Turma. Nos termos do artigo 49 do Código de Ética e Disciplina da OAB a competência da Turma Deontológica é responder, em tese, questões sobre ética profissional que lhe sejam encaminhadas. Esta Turma não tem, portanto, competência para analisar questões de direito, de competência específica do Poder Judiciário. A responsabilidade ética do advogado no exercício de sua profissão só existirá se houver alguma conduta sua (ativa ou omissiva), com falha ética. O advogado que tomar conhecimento de que seu colega, sendo ambos patronos do mesmo cliente no mesmo processo, levantou depósito judicial sem o repassar ao cliente, deve alertar o colega para que faça imediatamente o repasse devido. Se isto não ocorrer deve notificar o cliente do levantamento feito para que este possa exigir do outro advogado a devida prestação de contas. Evitará, com isto ser responsabilizado eticamente por omissão. Proc. E-4.465/2015 - v.u., em 02/02/2015, do parecer e ementa do Rel. Dr. ZANON DE PAULA BARROS - Rev. Dr. FÁBIO TEIXEIRA OZI - Presidente Dr. CARLOS JOSÉ SANTOS DA SILVA.

RELATÓRIO - O consulente apresenta a consulta que transcrevo ipsis litteris, à guisa de relatório:

a) Quando um advogado faz o levantamento do depósito judicial e não repassa ao cliente, a quais sanções o mesmo está sujeito (cível, criminal e disciplinar)?

b) Caso exista outro advogado na procuração - que nada sabia acerca do não repasse do depósito ao outorgante/cliente - qual a responsabilidade (cível, criminal e disciplinar) deste outro advogado?

c) Caso exista responsabilidade do advogado que não levantou o depósito, mas tão somente agiu processualmente pelos poderes que lhe foi outorgado, qual o conselho desta turma para minimizar as sanções e demonstrar boa-fé do advogado que simplesmente estava incurso na procuração?

PARECER - Para mais fácil análise, examinarei cada item individualmente;

a) Quando um advogado faz o levantamento do depósito judicial e não repassa ao cliente, a quais sanções o mesmo esta sujeito(cível, criminal e disciplinar)?

Esta indagação me parece, a toda evidência, referir-se a conduta de terceiro. Não consigo acreditar que alguém que tenha estudado direito e obtido a inscrição na OAB confesse perante esta Turma Deontológica ter praticado apropriação indébita, indagando quais as penalidades a que estaria sujeito pelo seu ato.

Assim, tomando por base a Resolução n. 7/95, desta Turma, que não admite “consultas ou pedidos de orientação sobre atos, fatos, ou conduta relativos ou envolventes de terceiros”, não conheço da consulta contida na alínea “a” acima transcrita.

b) Caso exista outro advogado na procuração - que nada sabia acerca do não repasse do depósito ao outorgante/cliente - qual a responsabilidade (cível, criminal e disciplinar) deste outro advogado?

A responsabilidade civil ou criminal dependerá da análise completa dos fatos, o que não acontece nesta Turma Deontológica. Além disto, competência desta turma, nos termos do artigo 49 do Código de Ética e Disciplina da OAB, é responder em tese, as questões sobre ética profissional que lhe sejam encaminhadas. Esta Turma não tem, portanto, competência para analisar questões de direito, de competência específica do Poder Judiciário.

A responsabilidade disciplinar do advogado também dependerá da análise especifica dos atos e fatos, o que não ocorre nesta Turma, mas somente nas Turmas Disciplinares. Entretanto, informo ao consulente que a infração ética decorre apenas da conduta (ativa ou omissiva) do advogado, que demonstre desvio de caráter. Ressalte-se que a ética (do grego, ethos), está relacionada ao caráter, diferentemente da moral (do latim mos, moris) que está relacionada aos costumes. Estes são muito mais mutáveis e muitas coisas que eram tidas como imorais 50 anos atrás, hoje são vistas pela sociedade sem qualquer restrição moral. Por outro lado, no Brasil antes do Século XVI não era imoral andar nu em público o que não é aceito moralmente hoje em dia.

Já o conceito de caráter (ethos) é muito mais estável. Trair um amigo sempre foi considerado, desde que surgiu a sociedade, como uma falha de caráter. Os preceitos de Ulpiano no Século II, “honeste vivere, alterum non laedere, suum cuique tribuere”, embora apresentados como de justiça, são exatamente preceitos de caráter e, portanto éticos, permanecendo válidos ao longo desses quase dois mil anos. Assim, repito, como não fazemos nesta Turma qualquer análise fática, respondo ao consulente que sua responsabilidade, relativamente ao que ele se referiu, só existirá se houve alguma conduta sua (ativa ou omissiva), com falha ética.

c) Caso exista responsabilidade do advogado que não levantou o depósito, mas tão somente agiu processualmente pelos poderes que lhe foi outorgado, qual o conselho desta turma para minimizar as sanções e demonstrar boa-fé do advogado que simplesmente estava incurso na procuração?

Entendo que o advogado que também é mandatário, tomando conhecimento de que seu colega levantou o depósito sem o repassar ao cliente, deve, para não ser responsabilizado como conivente (conduta omissiva), alertar o colega para que repasse imediatamente ao cliente a quantia levantada, compensando-se, se for o caso, honorários devidos, desde que prevista a retenção em contrato ou se autorizada pelo cliente (CED, art. 35, § 2º).

Finalmente, na hipótese de o colega não tomar a providência de prestar contas do levantamento, entendo que o consulente não se deve omitir e, na qualidade de patrono que também é, deve notificar o cliente do levantamento feito pelo seu colega para que o cliente possa cobrar-lhe a prestação de contas.

Desta forma, não tendo sido sujeito ativo do levantamento do depósito e não se omitindo no dever de alertar o colega para a prestação de contas e, se necessário, notificar o cliente do levantamento de que tomou conhecimento, o consulente se eximirá de responsabilidade ética na situação relatada.