E-4.590/2016


HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - CUMULAÇÃO DE HONORÁRIOS FIXOS COM HONORÁRIOS AD EXITUM - POSSIBILIDADE. COBRANÇA DE VALORES FIXOS MENSAIS A TÍTULO DE MANUTENÇÃO DE PROCESSO - IMPOSSIBILIDADE - VALORES FIXOS MENSAIS PODEM SER COBRADOS A TÍTULO DE HONORÁRIOS OU DESPESAS - ÚNICAS RUBRICAS POSSÍVEIS DE SEREM CONTABILIZADAS - PREVISÃO DE COBRANÇA DE VALORES NAS HIPÓTESES DE TÉRMINO DA RELAÇÃO COM O CLIENTE POR CIRCUNSTÂNCIA ALHEIA À VONTADE DO ADVOGADO - POSSIBILIDADE

Em tese, não existe impedimento ou infração ético-disciplinar na fixação de honorários contratuais, ressalvada a existência de eventual abuso e/ou ausência de moderação, proporcionalidade, razoabilidade, etc. Pela mesma razão, em tese, não há impedimento ou infração ético-disciplinar em prever pagamento de valor nas hipóteses de término do contrato de prestação de serviços advocatícios por circunstância alheia à vontade do advogado, ressalvadas, também nesse particular, a existência de eventuais abusos, imodicidade, necessária proporcionalidade, tempo despendido e etc. O valor fixo mensal contratado junto ao cliente deve ser cobrado a título de honorários por serviços prestados, caso não haja desembolso do advogado/escritório para a realização do trabalho, ou como despesa, havendo necessidade de reembolso de numerário, hipótese essa que exigirá a competente prestação de contas, sendo essas duas as únicas rubricas possíveis de serem contabilizadas em relação aos valores recebidos pelo advogado.
Proc. E-4.590/2016 - v.m., em 26/04/2016, do parecer e ementa do Rel. Dr. FÁBIO GUIMARÃES CORRÊA MEYER, com voto parcialmente divergente do Julgador Dr. SÉRGIO KEHDI FAGUNDES - Rev. Dr. LUIZ ANTONIO GAMBELLI - Presidente Dr. PEDRO PAULO WENDEL GASPARINI.


VOTO VENCEDOR DO RELATOR DR. FÁBIO GUIMARÃES CORRÊA MEYER.

RELATÓRIO - A Consulente quer saber se existe algum impedimento ou infração ética na contratação de honorários advocatícios que preveja a cumulação de pagamentos parcelados no curso do processo com percentual vinculado ao benefício econômico obtido ao final pelo cliente, a ser pago também de maneira parcelada.

Ainda, a Consulente indaga se ao cobrar valor mensal, a título de manutenção do processo, ou se exigir o pagamento antecipado da integralidade dos honorários contratados, na hipótese de encerramento do contrato de honorários por circunstâncias alheias à sua vontade, estaria a incorrer em infração ética.   

Após breve exposição acerca da consulta em tela, cumpre ao Relator ressaltar que o Código de Ética e Disciplina preceitua, no artigo 49, a competência do Tribunal de Ética e Disciplina, informando que tal órgão é competente para “orientar e aconselhar sobre ética profissional, respondendo às consultas em tese, e julgar os processos disciplinares.”

“O Tribunal de Ética e Disciplina é competente para orientar e aconselhar sobre ótica profissional, respondendo às consultas em tese, e julgar os processos disciplinares.”

Esta competência é, ainda, complementada pelo artigo 50.

Ademais, a Resolução nº 07/95 desta Primeira Turma do Tribunal de Ética e Disciplina da Seção de São Paulo, da Ordem dos Advogados do Brasil é clara ao prever que não devem ser admitidas consultas ou pedidos que tenham traços de casos concretos.

Pois bem. Após minuciosa análise da consulta ora formulada, este Relator destaca que a presente consulta possui nítidos traços de caso concreto; contudo é possível que seja respondida em tese.

PARECER - É possível a cumulação de honorários fixos com ad exitum, desde que respeitados os limites éticos, como o princípio da moderação. Em causas cíveis, a soma de tais honorários não deve ultrapassar o montante de 20% do valor em disputa.

O advogado não deve cobrar valores mensais a título de despesas para custear o acompanhamento do processo, uma vez que os custos com a estrutura do escritório são ônus do advogado. Pode, ainda, cobrar antecipadamente as despesas, porém, fica obrigado a prestar contas mensalmente dos gastos efetuados. Pode sim receber honorários mensalmente, mas que devem ser descontados dos honorários totais recebidos e todos somados devem respeitar o princípio da moderação.

O valor mensal cobrado a título de manutenção do processo somente pode ser cobrado sob a rubrica de honorários ou de despesas, aduzindo-se que, quando de despesa não se trate, serão honorários.

Não há dúvida quanto à possibilidade de cumulação de honorários fixos com ad exitum, sendo inclusive uma das formas recorrentes de contratação de honorários nos dias atuais, incluindo hipótese em que os honorários fixos pagos no curso do procedimento sejam oportunamente abatidos do total do êxito devido.

Nem poderia ser diferente, pois o profissional é livre para ofertar à sua clientela a modalidade de contratação de seus serviços, desde que observe rigorosamente os parâmetros éticos e estatutários.

Como o Estatuto da Advocacia e o Código de Ética não vedam a cumulação, mas, ao revés, inclusive a permitem expressamente em relação a honorários contratados e de sucumbência (art. 22, EOAB e art. 35, §1º, CED), afigura-se perfeitamente possível a modalidade de contratação de honorários fixos cumulados com êxito.

Da mesma forma, no tocante aos pagamentos mensais ditos a título de manutenção do processo. Esse valor mensal deve ser cobrado do cliente a título de honorários por serviços prestados, caso não haja desembolso do advogado/escritório para a realização do trabalho, ou como despesa, havendo necessidade de reembolso de numerário, hipótese essa que exigirá a competente prestação de contas, sendo essas duas as únicas rubricas possíveis de serem contabilizadas em relação aos valores recebidos pelo advogado.

Quanto à possibilidade de vencimento antecipado da totalidade dos honorários contratados (inclusive o êxito), na hipótese de término do contrato de prestação de serviços advocatícios por circunstância alheia à vontade do advogado, haverá sempre de serem obedecidos os critérios da moderação e razoabilidade. Ao advogado caberá o recebimento de honorários, inclusive de êxito, se e quanto este se verificar, proporcionais ao trabalho realizado, cabendo o arbitramento, caso advogado e cliente não se acertem quanto aos valores pendentes. 

Diante de tais colocações, respondemos a Consulente que é possível cumular honorários fixos com honorários ad exitum, cabendo, igualmente, cobrança mensal de valores para acompanhamento do processo, mas a título de honorários ou de reembolso de despesas, conforme o caso, fazendo ainda o advogado jus, em caso de rompimento antecipado do contrato de prestação de serviços sem justa causa, ao recebimento de honorários, inclusive de êxito, proporcionais ao trabalho realizado, a ser arbitrado em caso de não existir acerto de valores entre as partes.

VOTO PARCIALMENTE DIVERGENTE DO JULGADOR DR. SÉRGIO KEHDI FAGUNDES

RELATÓRIO - Adoto o relatório e as razões de decidir do voto vencedor.

Divergi, no entanto, da questão de ordem levantada, onde fui vencido, porque entendo que o ponto da limitação da contratação de honorários a 20% do valor em disputa nas causas cíveis deveria também ser tratado no voto, para que a consulta ficasse integralmente respondida, e a consulente orientada sobre todos os aspectos do tema.

Isto porque, ao tratar da possibilidade de cumulação de honorários fixos e ad exitum, e da contratação de honorários mensais para manutenção do processo, parece imprescindível dizer se há ou não limite máximo para contratação da honorária como um todo, nas causas cíveis.

Coerente com essa crença, declaro voto divergente para consignar que, no meu particular entendimento, o Estatuto da Advocacia e o Código de Ética e Disciplina não se ocupam em estabelecer limite máximo de valor para fixação de honorários contratuais, posto prevalecer a liberdade de contratar.

A preocupação do regramento estatutário e ético está em assegurar que o advogado proceda de forma que o torne merecedor de respeito e contribua para o prestígio da classe e da advocacia (art. 31, Estatuto OAB), resguardando a dignidade da profissão.

Assim, o art. 36, do CED estabelece que os honorários sejam fixados com moderação, atendendo aos elementos que relaciona1.

Nota-se que os elementos a serem atendidos para fixação dos honorários são subjetivos, possibilitando ao advogado considerar, casuisticamente, todas as diversas situações relacionadas às atividades privativas da advocacia, para que, no momento da contratação, tenha liberdade de acertar sua remuneração, incluindo hipóteses onde não haja valor em disputa ou benefício econômico. Não há qualquer referência ao percentual de 20% do valor em disputa.

E para reforçar o entendimento de que não há limite máximo para contratação de honorários, a interpretação teleológica e sistemática do art. 41, do CED, ao determinar que o advogado evite fixar honorários irrisórios ou inferiores ao mínimo fixado na Tabela de Honorários, e do art. 22, par. 2º, ao estabelecer que, na falta de estipulação ou acordo, a remuneração do advogado não poderá ser inferior ao estabelecido na tabela. 

Ora, pelo exame da Tabela de Honorários, existe para todas as atividades advocatícias ali relacionadas a indicação de mínimos a serem observados pelos advogados, para que não haja aviltamento dos valores dos serviços profissionais.

A tabela apresenta, ainda, outros valores e percentuais, inclusive de 20%, para determinadas atividades, mas sem dizer se tratar de valor máximo, como expresso em relação ao mínimo, sendo certo que, para os fins do art. 22, par 2º, tal percentual seria o piso, e não o teto, da remuneração, quando considerado em conjunto com o trabalho e o valor econômico da questão.

Logo, não há no regramento estatutário e ético previsão de limite máximo para contratação de honorários advocatícios.

Sem prejuízo, existe imposição expressa para que os honorários sejam fixados com moderação.

Mas essa moderação a que se refere o art. 36, do CED, como visto, não há de ser tida como aquela limitada a 20% do valor em disputa, nas causas cíveis, à míngua de previsão nesse sentido.

Para fins éticos, tudo indica que moderação na contratação de honorários significa, em linhas gerais, aquela que seja razoável e proporcional; que guarde relação com o trabalho prestado; que não importe vantagem excessiva, considerando o que ordinariamente seja cobrado para idêntico serviço; aquela em que não haja proveito do estado de necessidade ou da inexperiência do cliente; que não evidencie má-fé, abusos nem lesão ao constituinte, após adequadamente atendidos os elementos listados no art. 36, do CED.

Nesse contexto, indispensável que advogado e cliente se entendam desde logo, de maneira clara e inequívoca, quanto aos detalhes e aspectos da contratação dos honorários, com vistas a afastarem eventuais vícios de consentimento na formação do contrato. 

Em tese, porém, não existe impedimento ou infração ético-disciplinar na fixação de honorários contratuais, na forma e pelos valores livremente pactuados com o cliente, ressalvada, evidentemente, a existência de eventual abuso, e/ou ausência de moderação, proporcionalidade, razoabilidade, etc., as quais, todavia, somente podem ser aferidas no caso concreto.

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[1] i) relevância, vulto, complexidade e dificuldade das questões versadas; ii) trabalho e tempo necessários; iii) eventual impedimento do advogado de intervir em outros casos, ou de se desavir com outros clientes ou terceiros; iv) valor da causa, condição econômica do cliente e  proveito para ele resultante do serviço profissional; v) o caráter da intervenção, conforme se trate de serviço a cliente avulso, habitual ou permanente; vi) lugar da prestação dos serviços, fora ou não do domicílio do advogado; vii) a competência e o renome do profissional; e viii) a praxe do foro sobre trabalhos análogos.