E-5.270/2019
ESTAGIÁRIO DE DIREITO – FORMULAÇÃO DE PERGUNTAS ÀS PARTES EM AUDIÊNCIA – HIPÓTESE DE POSTULAÇÃO AO PODER JUDICIÁRIO – ATO PRIVATIVO DE ADVOGADO – PRÁTICA DO ATO EM CONJUNTO COM ADVOGADO RESPONSÁVEL PELO ESTÁGIO E SOB SUPERVISÃO DESTE – POSSIBILIDADE.
O estagiário de direito regulamente inscrito nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil, desde que em conjunto com advogado responsável e sob responsabilidade deste, pode postular ao Poder Judiciário, inclusive para formular perguntas diretamente às partes em audiência. Inteligência dos artigos 1º, inciso I e 3º, §2º, do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil. Precedentes. Proc. E-5.270/2019 - v.u., em 18/09/2019, do parecer e ementa do Relator – Dr. FÁBIO TEIXEIRA OZI, Revisor – Dr. DÉCIO MILNITZKY, Presidente Dr. GUILHERME MARTINS MALUFE.
Relatório:
O Consulente, regularmente inscrito nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil, dirige consulta a esta Turma Deontológica sobre a possibilidade de o estagiário de direito, em conjunto com advogado responsável e sob responsabilidade deste, formular perguntas diretamente às partes em audiência.
Em sua indagação, o Consulente pede resposta sobre eventual infração ético-disciplinar cometida tanto pelo advogado quanto pelo estagiário, considerando as disposições do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (“EOAB”). Por fim, apresenta casos análogos julgados por esta Turma.
Parecer:
Compete a esta Turma Deontológica apreciar consultas formuladas em tese sobre matéria ético-disciplinar, nos termos dos artigos 71, inciso II, do Código de Ética e Disciplina, 136, §3º, inciso I, do Regimento Interno desta Seccional, e 7º, inciso I, do Regimento Interno do Tribunal de Ética e Disciplina desta Seccional.
No caso ora tratado, em que pese se estar diante de uma situação nitidamente concreta, entendo que o tema é relevante e pode ser analisado em tese, razão pela qual conheço da consulta, para manifestar meu entendimento quanto à possibilidade da prática do ato em questão pelo estagiário de direito regularmente inscrito nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil, sob supervisão e em conjunto com advogado responsável pelo estágio.
De início, destaco que se aplicam ao presente caso as seguintes disposições do EOAB: (i) artigo 1º, inciso I, que estabelece ser a postulação a órgão do Poder Judiciário uma atividade privativa de advocacia, e (ii) artigo 3º, §2º, que possibilita ao estagiário de direito, regularmente inscrito na OAB, praticar os atos previstos no referido artigo 1º, desde que em conjunto com advogado e sob responsabilidade deste.
A solução desta consulta está alicerçada na constatação de que a formulação de perguntas às partes em audiência configura hipótese da atividade de postulação ao Poder Judiciário. E, assim sendo, o estagiário de direito que formula perguntas em audiência e, portanto, postula ao Poder Judiciário, o faz em simples exercício de sua prerrogativa legal, contanto que na presença e em conjunto com advogado responsável e devidamente inscrito nos quadros da OAB.
Além do fato de inexistir qualquer ressalva no EOAB quanto a determinados e específicos atos de postulação ao Poder Judiciário que o estagiário de direito, em tese, não possa praticar, a formulação de perguntas às partes em audiência, assim como a elaboração de peças processuais, são evidentes atividades inerentes à postulação permitida pela norma.
Basta observar, nesse ponto, que o direcionamento de peças processuais escritas, elaboradas e subscritas em conjunto por patrono e estagiário, não geram qualquer dúvida a respeito da conformidade legal e/ou ético-disciplinar do ato. O direcionamento verbal de perguntas em audiência, também como expressão dessa mesma atividade de postulação ao Poder Judiciário, tampouco deveria levantar tais questionamentos.
Impedir o estagiário de direito, regularmente inscrito nos quadros da OAB, de formular perguntas às partes em audiência, quando o faz na presença e em conjunto com advogado responsável, seria impor-lhe restrição de prerrogativa e vedar sua atividade, sem fundamento legal para tanto.
Esta Turma Deontológica inclusive já se manifestou nesse sentido, conforme se verifica do seguinte precedente:
“ESTAGIÁRIO - PARTICIPAÇÃO EM AUDIÊNCIAS - ATIVIDADE LIMITADA. O estagiário de direito pode participar de audiência, tomar assento à mesa, assinar o termo, entre outros necessários, desde de que o faça em conjunto e sob a responsabilidade de um advogado. Inteligência do artigo 3º, § 2º, da Lei n. 8.906/94, artigo 29, § 1º, incisos I a III do Regulamento Geral. O estagiário deve obedecer ao disposto nos arts. 28, 30 e 31 do Código de Ética e Disciplina, bem como ao Provimento n. 94/00, do CFOAB quanto ao seu impresso. (Proc. E-2.744/03 - v.u. em 22/05/03 do parecer e ementa da Rel.ª Dr.ª ROSELI PRÍNCIPE THOMÉ - Rev. Dr. JAIRO HABER - Presidente Dr. ROBISON BARONI)
(...) O estágio profissional vem previsto no artigo 3º, parágrafo 2º, da Lei nº 8906/94 e no artigo 29, § 1º, incisos I a III, do Regulamento Geral. Portanto, o estagiário pode praticar os atos privativos do advogado, desde que em conjunto com esse e sob sua responsabilidade. Seguindo este raciocínio, juntamente com o advogado e para auxiliá-lo, pode o estagiário participar de audiências, ocupar assento à mesa; comunicar-se com o advogado, entre outras atividades necessárias, inclusive subscrever o termo de audiência.”
Sendo assim, entende este Relator, em tese e sem adentrar ao caso concreto objeto da Consulta, que o estagiário de direito regularmente inscrito nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil, desde que na presença e em conjunto com advogado responsável, pode postular ao Poder Judiciário, inclusive para formular perguntas diretamente às partes em audiência, sem que haja cometimento de infração ético-disciplinar por ele ou pelo advogado.
É o parecer que submeto aos meus pares.