E-5.393/2020
ADVOGADO QUE EXERCE FUNÇÃO NA OAB – CANDIDATO A CARGO JUNTO AO PODER LEGISLATIVO – DESNECESSIDADE DE SE DESINCOMPATIBILIZAR DA FUNÇÃO NO PLANO ÉTICO, RESSALVADA A EXISTÊNCIA DE NORMAS PREVISTAS NA LEI ELEITORAL QUE DETERMINEM QUE ASSIM SE PROCEDA – AUSÊNCIA DE IMPEDIMENTO PARA EXERCER A ADVOCACIA.
No plano ético, advogado que exerce função na OAB não precisa desincompatibilizar-se da referida função caso opte por participar em pleito eleitoral para concorrer a cargo no poder legislativo nem estaria, nestas circunstâncias, impedido de advogar. Simples candidatura a cargo eletivo não se encontra no rol dos impedimentos para exercício da advocacia nem restringe o exercício de cargos ou funções na OAB, desde que não implique captação de clientela, obtenção de vantagem indevida, concorrência desleal ou qualquer conduta que possa ferir a ética na advocacia. Por outro lado, sendo a desincompatibilização ou afastamento do cargo da OAB obrigatória em vista da Lei Eleitoral, o que não nos cabe aqui analisar em vista da competência desta Turma, deverá o advogado assim proceder. Proc. E-5.393/2020 - v.u., em 20/10/2020, do parecer e ementa do Rel. Dr. RICARDO BERNARDI, Rev. Dra. CRISTIANA CORRÊA CONDE FALDINI - Presidente Dr. GUILHERME MARTINS MALUFE.
Relatório:
O consulente aduz o seguinte questionamento: “solicitamos saber se o advogado, ao se candidatar para cargo de vereador, requer a desincompatibilização da função de Presidente de Comissão ocupada na Subseção, ao optar pela participação no pleito eleitoral? Neste caso, há impedimento?”.
Muito embora a redação não esteja clara, este relator entende que o questionamento se refere à obrigatoriedade de o advogado, que exerce função de Presidente em Comissão na OAB, desincompatibilizar-se da referida função caso opte por participar em pleito eleitoral e se, nesta hipótese, estaria impedido, imagino, de exercer atividade advocatícia.
Parecer:
Conheço a consulta porque envolve questionamento sobre matéria em tese, compreendida, portanto, no âmbito da competência desta Primeira Turma Deontológica do Tribunal de Ética e Disciplina.
Inicialmente, nos parece que a situação envolve advogado que se candidata ao cargo de vereador, portanto, aspira ao cargo público, não o exercendo no momento do protocolo da consulta. É com base nesta premissa que analisaremos as duas questões que se colocam, quais sejam: a) advogado que exerce função de Presidente em Comissão na OAB deve desincompatibilizar-se da referida função caso opte por participar em pleito eleitoral para concorrer a cargo de vereador? e b) se advogado que opta por participar em pleito eleitoral para concorrer a cargo de vereador estaria impedido de advogar.
Abordando o primeiro questionamento, a reposta nos parece negativa sob a ótica das normas que regem a ética na advocacia. Advogado que exerce função na OAB não precisa desincompatibilizar-se da função caso opte por participar em pleito eleitoral, ressalvada disposição diversa prevista na legislação eleitoral.
A participação em órgão diretivo da OAB exige exercício regular da profissão, o que não deixa de existir caso o advogado decida concorrer a cargo de vereador ou qualquer outro. Uma vez eleito, a situação poderia ser distinta, mas não será aqui analisada, uma vez que foge aos limites da consulta formulada.
As restrições impostas aos advogados que exercem cargos ou funções na OAB encontram-se descritas no art. 32 e 33 do CED, que assim dispõe:
Art. 32. Não poderá o advogado, enquanto exercer cargos ou funções em órgãos da OAB ou representar a classe junto a quaisquer instituições, órgãos ou comissões, públicos ou privados, firmar contrato oneroso de prestação de serviços ou fornecimento de produtos com tais entidades nem adquirir bens imóveis ou móveis infungíveis de quaisquer órgãos da OAB, ou a estes aliená-los. (NR)3
Art. 33. Salvo em causa própria, não poderá o advogado, enquanto exercer cargos ou funções em órgãos da OAB ou tiver assento, em qualquer condição, nos seus Conselhos, atuar em processos que tramitem perante a entidade nem oferecer pareceres destinados a instruí-los.
Percebe-se que as limitações se restringem a condutas que, em linhas gerais, possam representar o uso de cargo com o escopo de captação de clientela ou para obter vantagem indevida, entre as quais não se encontra a candidatura a cargo público.
Com relação a esse assunto, trazemos a ementa abaixo:
INCOMPATIBILIDADE E IMPEDIMENTO - ADVOGADO ELEITO VEREADOR - CARGO DE DIREÇÃO NA OAB – POSSIBILIDADE. Advogado eleito vereador está incompatibilizado para a advocacia se integrar a mesa diretora do legislativo e deve pedir seu afastamento do quadro de inscritos na OAB. Estará impedido se apenas exercer a vereança. A participação em órgão diretivo da OAB exige exercício regular da profissão, o que não abrange o incompatibilizado, mas faculta ao impedido. O impedimento e a incompatibilidade têm por princípios evitar a captação de causas, de clientes, a concorrência desleal e a tergiversação, esta inclusive como ilícito penal previsto no art. 355, parágrafo único, do Código Penal. Inteligência dos arts. 28, 30 e 63 do EAOAB. Proc. E-2.821/03 - v.m. em 16/10/03 do parecer e ementa do Rel. Dr. JOÃO TEIXEIRA GRANDE contra o voto da Rev.ª Dr.ª ROSELI PRÍNCIPE THOMÉ - Presidente Dr. ROBISON BARONI.
Ora, se mesmo após eleito Vereador, foi considerada viável a manutenção de advogado em cargo de direção na OAB, ressalvados os impedimentos, com muito mais razão tal deve ser admitido no caso sob consulta, em que se trata apenas de candidato ao cargo, desde que não implique captação de clientela, concorrência desleal ou qualquer conduta que possa ferir a ética na advocacia.
Ressalve-se, todavia, que a questão é aqui analisada exclusivamente no plano ético, e não à luz da legislação eleitoral, o que deve ser devidamente observado pelo candidato. Nesse sentido, em vista da lei eleitoral, a desincompatibilização pode tornar-se obrigatória. Neste sentido, destaque-se precedente deste tribunal em situação análoga:
DIRIGENTES DA OAB - CANDIDATOS A CARGOS ELETIVOS PÚBLICOS NO PODER EXECUTIVO E LEGISLATIVO - DESINCOMPATIBILIZAÇÃO - REGRA GERAL - PRAZO LEGAL DE 4 (QUATRO) MESES - AFASTAMENTO OBRIGATÓRIO PERANTE A INSTITUIÇÃO - DESNECESSIDADE DE RENÚNCIA - SITUAÇÕES ESPECÍFICAS DEVEM SER DIRIMIDAS PELA JUSTIÇA ELEITORAL. A desincompatibilização decorre de Lei Eleitoral específica, sendo que a jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral e doutrina fixam como regra geral, o prazo de quatro meses antes do pleito para os ocupantes de cargos diretivos na OAB, aí entendidos a Diretoria Executiva, Conselheiros e demais partícipes ocupantes de função de direção, administração ou representação. Alguns cargos em órgãos da OAB, mesmo que não ocupados pela Diretoria Executiva ou Conselheiros, possuem grande visibilidade, extrapolando os limites da entidade, alcançando o grande público, quer em nível nacional, estadual e municipal, podendo, em tese, seus ocupantes deles beneficiarem-se, prevalecendo neste momento, em nosso entender, a razão de ser da desincompatibilização. Descabe a OAB legislar sobre direito eleitoral, devendo o interessado, se dúvidas houver, buscar junto ao Tribunal Eleitoral orientação individualizada quanto à extensão e alcance do disposto no artigo 1, II e II da Lei Complementar 64/90, quanto à desincompatibilização. No plano interno entende-se que o advogado não necessita apresentar renúncia ao cargo, mas apenas afastamento para concorrer ao pleito. Se sucesso houver, poderá ocorrer impedimento ou incompatibilidade dependendo do cargo, conforme preceituam os artigos 27 "usque" 30 do Estatuto. A renúncia, tal qual a participação no pleito eleitoral, é opção do interessado, arcando com as consequências de seus atos perante seus pares, descabendo à Ordem obstar a participação de dirigente no democrático processo político, enaltecendo o papel do advogado na sociedade. Inteligência da Lei complementar nº 64/90, Resolução nº 16.551 do TSE, processos 5.317/99 e 0008/2002 do Conselho Federal Processo 2.964/04 do TED e artigos 27 "usque" 30 do Estatuto. Proc. E-4.417/2014 - v.u., em 21/08/2014, do parecer e ementa do Rel. Dr. FÁBIO KALIL VILELA LEITE - Rev. Dr. LUIZ ANTONIO GAMBELLI - Presidente em exercício Dr. CLÁUDIO FELIPPE ZALAF.
Já nos encaminhando ao segundo questionamento, ressalvamos que, enquanto apenas candidato, não exercendo o cargo de vereador, não estaria o advogado impedido de exercer a advocacia. O impedimento apenas existiria caso eleito vereador e no momento em que tomasse posse do cargo, conforme dispõe o inciso II do art. 30 do EOAB.
De acordo com o referido dispositivo legal, “são impedidos de exercer a advocacia”, “os membros do Poder Legislativo, em seus diferentes níveis, contra ou a favor das pessoas jurídicas de direito público, empresas públicas, sociedades de economia mista, fundações públicas, entidades paraestatais ou empresas concessionárias ou permissionárias de serviço público”
A respeito do tema, veja ementa desta Turma abaixo:
EXERCÍCIO DA ADVOCACIA - IMPEDIMENTO - ADVOGADO VEREADOR - ASSUNÇÃO DE CARGO DE PRESIDENTE DE COMISSÃO INTERNA DA CÂMARA DE VEREADORES - FUNÇÃO INERENTE AO CARGO - POSSIBILIDADE. Ao tomar posse como vereador, automaticamente o advogado passa a estar impedido de exercer a advocacia contra ou a favor das pessoas jurídicas de direito público, empresas públicas, sociedades de economia mista, fundações públicas, entidades paraestatais ou empresas concessionárias ou permissionárias de serviço público, nos termos do art. 30, I da lei n. 8.904/94 (EOAB). Conforme precedentes deste Tribunal, caso o advogado patrocine causas que se enquadrem nas hipóteses acima, deverá notificar os clientes, comunicando-os sobre seu impedimento, devendo ainda substabelecer os poderes a outro advogado desimpedido. No que se refere à assunção de cargo de presidente de comissão interna da Câmara de Vereadores, trata-se de função inerente ao cargo, não havendo, em tese, impedimento ou incompatibilidade. Referidas comissões têm por objetivo elaborar pareceres acerca, por exemplo, da constitucionalidade de determinado projeto de lei, ou do impacto financeiro que causaria ao erário, sendo os pareceres utilizados como embasamento para a aprovação ou não de determinado projeto de lei, que deverá ser normalmente submetido ao processo de votação e aprovação dos demais vereadores. Assim, o presidente da Comissão não possui poder de decisão suficiente para caracterizar a incompatibilidade prevista no art. 28, nem impedimento diverso daquele que já está caracterizado (art. 30, I do EOAB). Proc. E-4.793/2017 - v.u., em 20/04/2017, do parecer e ementa do Rel. Dr. GUILHERME MARTINS MALUFE, Rev. Dra. CRISTIANA CORRÊA CONDE FALDINI- Presidente Dr. PEDRO PAULO WENDEL GASPARINI. (grifos nossos)
A contrario sensu, antes de tomar posse, enquanto apenas candidato a cargo no Poder Legislativo, não se sujeita ao impedimento.
Este o Parecer, que submeto ao Juízo deste Egrégio Colegiado.