Artigo publicado no jornal " Folha de S. Paulo" de 05/08/2008
Na prática, o direito de acesso à Justiça ao cidadão carente no Estado de São Paulo vem sendo assegurado, nos últimos 22 anos, graças ao empenho de milhares de advogados abnegados que patrocinaram suas causas. Este direito constitucional deve ser arcado pelo Estado por meio da Defensoria Pública e, quando esta não dispuser de quadros suficientes – o que acontece em São Paulo – essa obrigação será suportada por convênio firmado com a Seccional Paulista da Ordem dos Advogados do Brasil, como expresso no Art. 109 da Constituição Estadual e no Art. 234 da Lei Complementar 988/06, que criou a Defensoria Pública .
No dia 11 de julho venceu o prazo para renovação do Convênio de Assistência Judiciária firmado entre a OAB SP e a Defensoria Pública. Em nenhum momento, a Ordem propôs o rompimento do convênio, mas a necessidade de sua renovação em bases mais justas para os 47 mil advogados conveniados que, no ano passado, atenderam quase um milhão de carentes em 313 postos espalhados por todo o Estado.
A Ordem encaminhou à Defensoria Pública proposta de renovação, contemplando reposição inflacionária, já prevista em cláusula do convênio, e aumento real escalonado de 1% a 10% sobre a tabela de honorários, que nas últimas duas décadas ficou tão defasada , que vem levando o advogado da assistência judiciária a receber quatro vezes menos do que consigna a tabela mínima de honorários da OAB SP, depois de 5 anos ou mais de tramitação do processo judicial.
Esta distorção fica ainda mais evidente diante do salário do defensor público, que realiza o mesmo trabalho e recebe em média R$ 8.000,00 mensais, além de contar com infra-estrutura física assegurada pelo Estado. No caso do advogado conveniado, o telefonema, o papel, a tinta da impressora, a energia elétrica etc. saem de seu próprio bolso. A Defensoria Pública, a princípio, não concordou em negociar, alegando não ter previsão orçamentária. Na verdade, dispõe desses recursos, uma vez que obteve reajuste no orçamento de 2007 para 2008 de 20%, o que possibilitaria abrir negociações.
Em todo episódio, a postura da OAB SP sempre foi muito transparente. Nunca esqueceu de seus compromissos com o interesse público, o Estado Democrático de Direito e a cidadania e quer continuar atendendo o hipossuficiente. Assim sendo, causou-nos perplexidade o editorial “Atitude Indefensável”, publicado nesta “ Folha de S. Paulo” (06/08/08-pag.A-2), que tratou o episódio da renovação do Convênio de Assistência Judiciária de forma flagrantemente parcial. Colocou a questão de estruturação da Defensoria Pública, criada há dois anos, de forma unilateral, como se a existência ou não do Convênio com a OAB SP fosse solucionar em definitivo as deficiências da Defensoria. Certamente, todos nós queremos uma Defensoria Pública com condições ideais de trabalho, a exemplo da Magistratura e do Ministério Público. Por óbvio, isso dependerá de tempo, de iniciativas que competem ao Executivo e ao Legislativo e do apoio da sociedade. É importante ressaltar que os recursos do Convênio com a OAB SP não saem da Defensoria, mas de parcela das Custas Extrajudiciais, que recompõem um fundo para este fim exclusivo. Caso o convênio acabe, estes valores não serão revertidos para o orçamento da Defensoria e, sim, para o Tribunal de Justiça de São Paulo, como previsto no EC-45.
Em nenhum momento a OAB SP se contrapôs ao interesse público ou à legalidade. Tanto que a Ordem obteve liminar em mandado de segurança na Justiça Federal contra o Edital da Defensoria Pública para cadastrar diretamente advogados e proibição do Tribunal de Contas do Estado para que esta viesse a nomear advogados com base nesta convocação direta, por ser inconstitucional e ilegal. O Estado, a OAB SP, a Defensoria Pública, a Imprensa, enfim todos, precisam observar a lei. Certamente, todo e qualquer problema da democracia só pode ser resolvido dentro da legalidade.
É importante reiterar que a OAB SP defendeu a criação da Defensoria Pública de São Paulo, manifestando seu apoio na Assembléia Legislativa e junto ao Governo do Estado. No entanto, não pode aceitar que os 47mil advogados conveniados sejam apenados com honorários aviltantes até que a Defensoria Pública, hoje com 400 defensores, tenha condições plenas de atendimento à população carente. Dessa forma, com a recente retomada das negociações sobre a renovação do Convênio esperamos que prevaleça o bom senso e o pleito dos advogados seja atendido no sentido de que possam continuar prestando um bom atendimento à população carente de nosso Estado.
Luiz Flávio Borges D´Urso
Presidente da OAB SP