E-4.141/2012
CONTRATO DE HONORÁRIOS - CLÁUSULA PENITENCIAL - IMPOSSIBILIDADE - HONORÁRIOS PROFISSIONAIS - FIXAÇÃO ACIMA DA TABELA DE HONORÁRIOS DA OAB - POSSIBILIDADE DESDE QUE RESPEITADOS OS PARÂMETROS DO CED, ESPECIALMENTE O DA MODERAÇÃO.
Por ser inerente à atividade advocatícia a existência de confiança recíproca entre advogado e cliente, a resilição desse contrato é direito de ambos e pode ser exercida a qualquer tempo, como se depreende dos artigos 14 e 16 do Código de Ética e Disciplina da OAB. Em tais condições, por tratar-se do exercício de um direito, não há como restringi-lo com aplicação de multa penitencial. Os honorários advocatícios podem ser estabelecidos em valores diferentes da Tabela de Honorários da OAB, desde que respeitados os parâmetros fixados no art. 36, do CED, especialmente o da moderação. Proc. E-4.141/2012 - v.u., em 16/08/2012, do parecer e ementa do Rel. Dr. ZANON DE PAULA BARROS - Rev. Dr. LUIZ FRANCISCO TORQUATO AVOLIO - Presidente Dr. CARLOS JOSÉ SANTOS DA SILVA.
RELATÓRIO – O consulente diz que busca sanar dúvida oriunda de contrato de prestação de serviços jurídicos com cláusula de multa na hipótese de rescisão por iniciativa do cliente. Diz que não encontrou na jurisprudência, no EAOAB nem no CED, “resposta sobre a validade da cláusula de multa sobre o saldo devedor do contrato do contrato de prestação de serviços de honorários advocatícios no caso de término da relação profissional”.
Faz, a seguir, várias considerações em torno dos contratos em questão para, ao final, pedir orientação sobre as seguintes dúvidas:
I - Validade da cláusula de cobrança de multa de 33 % ou qualquer outro percentual sobre o saldo devedor do contrato de prestação de serviços advocatícios no caso de sua rescisão, quando a apuração dos honorários deve ser feita de acordo com o EAOAB e O CED;
II - Validade dos honorários advocatícios estipulados acima do teto estabelecido pela Tabela de Honorários da OAB.
PARECER – Embora aparente tratar-se de caso concreto, a questão pode ser respondida em tese. Por isto e como não se vê questão envolvendo conduta de terceiro e também não há informação de a matéria em si já esteja em discussão no Poder Judiciário, entendo que a consulta pode ser respondida.
Quanto ao mérito a questão é simples.
Quanto à primeira parte, diferentemente do que diz o consulente, há jurisprudência desta Turma Deontológica tratando do assunto.
No processo E-2.894/2004, julgado em 18.03.2004, Relatora a Drª Roseli Príncipe Thomé e revisor o Dr. Osmar de Paula Conceição Júnior, sob a Presidência do Dr. João Teixeira Grande, decidido por maioria, prevalecendo o voto divergente do Dr. Fábio de Souza Ramacciotti, decidiu-se:
CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS – POSSIBILIDADE DE PREVISÃO DE CLÁUSULA PENAL PARA A HIPÓTESES DE INADIMPLEMENTO OU MORA – MODERAÇÃO – IMPOSSIBILIDADE, NO ENTANTO, DE PREVISÃO DE MULTA PARA A HIPÓTESE DE REVOGAÇÃO, PELO CLIENTE, DO MANDATO. POSSIBILIDADE, NESSE CASO, DE COBRANÇA DOS HONORÁRIOS PROPORCIONAIS AO TRABALHO EFETUADO. PREVISÃO CONTRATUAL DE CRITÉRIOS PARA AFERIR OS HONORÁRIOS PROPORCIONAIS. POSSIBILIDADE, DESDE QUE RESPEITADOS OS PRINCÍPIOS DO CED. O contrato de prestação de serviços advocatícios pode prever multa (cláusula penal) para a hipótese de mora ou inadimplemento, desde que seu montante seja fixado com moderação. No entanto, não pode referido contrato prever multa (penitencial) para a hipótese de o cliente revogar unilateralmente o mandato do advogado, hipótese em que o advogado terá direito ao recebimento dos honorários, ainda que proporcionais ao trabalho efetuado. Finalmente, pode o advogado inserir, de antemão, no respectivo contrato de prestação de serviços advocatícios, o modo de aferição dos honorários proporcionais ao trabalho efetuado até a data da extinção do contrato e da revogação do mandato, respeitado os preceitos éticos aplicáveis.
Já no processo E-3.578, julgado em 17.04.2008, Relatora Dr.ª BEATRIZ MESQUITA DE ARRUDA CAMARGO KESTENER, – Rev. Dr. CLÁUDIO FELIPPE ZALAF - Presidente Dr. CARLOS ROBERTO F. MATEUCCI entendeu-se de forma diferente, também por maioria, com declaração de voto divergente do julgador Dr. LUIZ ANTONIO GAMBELLI.
Finalmente, no processo E-3.734/2009 – julgado em 27/03/2009, do parecer e ementa do Rel. Dr. LUIZ ANTONIO GAMBELLI – Rev. Dr. EDUARDO TEIXEIRA DA SILVEIRA – Presidente Dr. CARLOS ROBERTO F. MATEUCCI, com votação unânime, entendeu-se:
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – RESCISÃO DO CONTRATO DE HONORÁRIOS UM DIA ÚTIL APÓS A SUA CELEBRAÇÃO – VALOR RECEBIDO ADIANTADO – HONORÁRIOS DEVIDOS – CLÁUSULA PENAL – TAXA PARA MANUTENÇÃO DE PROCESSO. Para procedermos com lealdade e boa-fé em nossas relações profissionais e em todos os atos do nosso ofício é preciso ter em mente não querer sempre levar vantagem e é aceitável perder. Aceitar perder não significa trabalhar de graça, mas cobrar de forma moderada e justa pelo trabalho efetivamente feito. Quando a rescisão contratual ou a revogação do mandato ocorre em momento onde sequer houve o início da prestação do serviço contratado ou a prática de algum ato judicial, o advogado não faz jus aos honorários cobrados antecipadamente, por força de princípios éticos e morais, onde um se confunde com o outro. Tem apenas o direito de recebimento dos honorários proporcionais ao trabalho efetuado. O advogado pode estabelecer no contrato de honorários cláusula penal para a hipótese de mora ou inadimplemento, desde que seu montante seja fixado com moderação. No entanto, não pode referido contrato prever multa para a hipótese de o cliente revogar unilateralmente o mandato do advogado, hipótese em que o advogado terá direito ao recebimento dos honorários proporcionais ao trabalho efetuado. Existe vedação ética para se cobrar taxa ou valores fixos a título de manutenção do processo. A forma de resgate dos encargos gerais e despesas com a condução do processo deve ser feita mediante reembolso dos valores efetivamente gastos, com detalhada prestação de contas e a exibição dos comprovantes das despesas cobradas, se o cliente assim o exigir. Nada impede, porém, previsão contratual de recebimento de valores adiantados a esse título, inclusive com valor mensal, desde que objeto de prestação de contas. Precedentes E-1203/95, E-2894/04, E-3146/95 e E-3571/08.
Esta a posição mais acertada a meu ver. Orlando Gomes, em sua festejada obra CONTRATOS, leciona:
“Podem as partes estipular que o contrato será resilido se qualquer delas se arrepender de o haver concluído. Asseguram-se convencionalmente o poder de resili-lo mediante declaração unilateral de vontade. A autorização não provém da lei, mas, no caso, do próprio contrato. São, realmente os próprios contratantes que estipulam o jus penitendi.”
“Normalmente, o exercício da faculdade de arrependimento tem sua contrapartida no pagamento de multa penitencial. Trata-se de pagamento de compensação pecuniária atribuída à parte que se viu privada da vantagem do contrato porque a outra se arrependeu de o ter celebrado” (Editora Forense, 5ª edição, fls. 221).
Ocorre que, nos contratos de serviços advocatícios, sua rescisão unilateral é condição inerente à advocacia, que se funda no princípio basilar da confiança recíproca. Cessada essa confiança, independentemente de qual seja o motivo, o contrato deve encerrar-se. Depreende-se isto pelo que está disposto nos artigos 14 e 16 do Código de Ética e Disciplina da OAB.
Assim, como pode o cliente revogar a qualquer tempo o mandato concedido, o contrato de serviços jurídicos também pode ser resilido a qualquer tempo. O mesmo vale para o advogado que, também a qualquer tempo, pode resilir seu contrato de serviços jurídicos, renunciando ao mandato que lhe foi outorgado. Tratando-se de um direito, é totalmente incabível a fixação de multa ante seu exercício.
A questão do estabelecimento de honorários acima do que dispõe a Tabela de Honorários da OAB é facilmente solucionada pelo que está disposto no art. 36, do Código de Ética e Disciplina da OAB, in verbis:
Art. 36. Os honorários profissionais devem ser fixados com moderação, atendidos os elementos seguintes:
I – a relevância, o vulto, a complexidade e a dificuldade das questões versadas;
II – o trabalho e o tempo necessários;
III – a possibilidade de ficar o advogado impedido de intervir em outros casos, ou de se desavir com outros clientes ou terceiros;
IV – o valor da causa, a condição econômica do cliente e o proveito para ele resultante do serviço profissional;
V – o caráter da intervenção, conforme se trate de serviço a cliente avulso, habitual ou permanente;
VI – o lugar da prestação dos serviços, fora ou não do domicílio do advogado;
VII – a competência e o renome do profissional;
VIII – a praxe do foro sobre trabalhos análogos
Só pela leitura do texto vê-se que a Tabela de Honorários da OAB é indicativa e, assim mesmo, indicativa do mínimo e não do máximo, máximo este que está balizado pelo princípio da moderação, estabelecido no caput do citado art. 36, do CED.