E-4.293/2013


EXERCÍCIO DA ADVOCACIA - ADVOGADO QUE INDICA CLIENTES - EXIGÊNCIA DE REMUNERAÇÃO - DESCABIMENTO - PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS NOVOS A CLIENTES APÓS FALECIMENTO DE ADVOGADO - REMUNERAÇÃO INDEVIDA À VIÚVA E HERDEIROS -SUBSTABELECIMENTO SEM RESERVAS - PRÉVIO E INEQUIVOCO CONHECIMENTO DO CLIENTE - DESNECESSIDADE DE CONCORDÂNCIA EXPRESSA

O advogado deve ter muito cuidado ao indicar clientes a colegas para não avançar no campo do agenciamento (intermediação) ou captação indevida de causas e clientes, vedadas pelos artigos 5º e 7º do CED, e incisos III e IV do artigo 34 do EOAB. O advogado que indica clientes, quando isso é possível, não pode exigir dos colegas participação percentual em honorários, pois a remuneração assegurada aos inscritos na OAB decorre exclusivamente da prestação de serviços jurídicos, dentre os quais não se inclui a indicação de clientela. Nada impede, porém, que o advogado receba remuneração que lhe venha a ser voluntariamente oferecida pela indicação. Viúva e herdeiros não têm direito de exigir percentual de honorários que venham a ser pagos por clientes, que foram do de cujus, a advogado que realiza contratação e execução dos serviços jurídicos novos, após o falecimento do colega. Contratação completamente estranha à viúva e herdeiros, sendo irrelevante, nessas condições, a relação pregressa do advogado falecido com os clientes agora assistidos por outro patrono. O substabelecimento sem reservas exige a prévia e inequívoca ciência do cliente (art. 24, § 1º, do CED), porque o mandante deve necessariamente saber, de antemão, quem será o substabelecido, justamente para que possa manifestar sua aceitação ou não quanto a ele, antes que efetivamente ocorra o substabelecimento sem reservas. Na prática, isso equivale, pelo menos, a um consentimento tácito quanto ao substabelecido, tornando desnecessário o consentimento expresso do cliente. Proc. E-4.293/2013 - v.u., em 22/08/2013, do parecer e ementa Rel. Dr. SÉRGIO KEHDI FAGUNDES - Rev. Dr. JOÃO LUIZ LOPES - Presidente Dr. CARLOS JOSÉ SANTOS DA SILVA.

RELATÓRIO – A Consulente indaga se seria lícito ao advogado cobrar percentual por indicação de clientes aos colegas e, em caso positivo, qual seria o percentual recomendável.

Ainda, a Consulente pergunta se, no caso de falecimento de colega, a viúva meeira e herdeiros poderiam exigir do advogado que é procurado por clientes do de cujus percentual dos honorários que venham a ser cobrados pela execução de novos serviços.

Em 9/8/13, a consulta foi aditada para esclarecer que as indagações inicialmente formuladas se referem à atuação de profissional autônomo, e não de sociedade de advogados, e também, para acrescentar outra dúvida, agora sobre a possibilidade de advogado substabelecer sem reservas de iguais poderes sem consentimento expresso do cliente.

Esse é o relatório.

PARECER – Trata-se de consulta envolvendo dúvidas de natureza ética profissional (art. 49, CED), que merece ser conhecida e respondida em tese.

Quanto à primeira indagação, existe entendimento dessa Turma Deontológica no sentido de que “Advogado que se prevalece de indicação freqüente e sistemática de intermediário subsume-se à prática de captação indevida de causas e clientes, concorrência desleal, inibe a liberdade do cliente na escolha de patrono, além de constituir oferta de serviços jurídicos através de interposta pessoa ou por quem não os pode prestar”, porque “A relação entre cliente e advogado deve ser baseada na confiança que esse inspira naquele através de vínculo que se cria livremente, sem influência de terceiros. Qualquer que seja o modo da indicação, verbal ou escrita, o advogado que aceita o patrocínio de causas vindas de uma pessoa com a qual mantém relação jurídica comete a infração descrita no art. 34, inciso IV do EOAB”. E-3.912/2010 - Precedentes E-3.714/2008 e E-2.642/2002. V.U., em 15/07/2010, do parecer e ementa do Rel. Dr. EDUARDO TEIXEIRA DA SILVEIRA – Rev. Dr. JOSÉ EDUARDO HADDAD – Presidente em exercício Dr. CLÁUDIO FELIPPE ZALAF.

Evidente, porém, que tais preceitos devem ser considerados caso a caso, com temperamentos, levando-se em conta os demais princípios éticos e o bom senso.

Isto porque, dadas as cada vez mais complexas e intrincadas relações sociais na atualidade, sabidamente há situações, aliás, corriqueiras, onde o advogado se vê demandado, algumas vezes até mesmo pelo próprio cliente, a indicar ou ser indicado, seja por conta de determinada especialização, existência de conflito de interesses ou outras circunstâncias que justifiquem a indicação para que haja a adequada, eficiente e responsável prestação do serviço jurídico, sem que isso possa ser tido, a priori, como prática antiética. 

Por isso, recomendável que o advogado esteja bastante atento e seja criterioso e cuidadoso no trato do assunto, abstendo-se sempre da prática de atos que possam se assemelhar ao agenciamento ou captação indevida de causas e clientes, isso sim vedado pela lei, constituindo, inclusive, infração disciplinar, a teor dos artigos 5º, 7º do CED e incisos III e IV do artigo 34 do EOAB.

Mas mesmo naqueles casos onde caiba justificativa, não se mostra ética a conduta do advogado que exige percentual pela indicação de clientes a colegas, porque os inscritos na OAB somente têm assegurado o recebimento de honorários decorrentes da prestação de seus serviços profissionais (art. 22, EOAB), dentre os quais, certamente, não se inclui a indicação de clientes a colegas.  Nada impede, porém, que o advogado receba percentual nessas circunstâncias, desde que voluntariamente oferecido. 

Com o segundo questionamento, a Consulente quer saber se advogado autônomo estaria obrigado a entregar percentual de seus honorários para viúva e herdeiros de advogado falecido, por ter prestado serviços ao cliente do de cujus.

Consta expressamente na consulta a informação de que foram prestados serviços novos, induzindo o entendimento de que os trabalhos foram contratados e executados em momento posteriormente ao falecimento, sem qualquer contribuição do de cujus, enquanto em vida.  

Além disso, presume-se que a Consulente, quando faz menção ao “cliente do de cujus”, quis em realidade se referir a seu próprio cliente, que no passado foi atendido pelo de cujus, quando este ainda era vivo, já que se desconhece advogado falecido que tenha cliente, até porque a inscrição do profissional falecido se cancela (art. 11, III, EOAB) e o mandato cessa pela morte (art. 682, II, CC).

Ainda, exceto pela coincidência do cliente comum, não há elemento adicional na consulta que permita inferir a existência de algum outro liame entre o advogado prestador de serviço e a viúva e herdeiros do advogado falecido.

Assim, assumindo que não existe qualquer compromisso verbal ou escrito criando obrigações perante terceiros, e que a contratação dos trabalhos foi posterior ao falecimento do advogado que atendia clientes anteriormente, o profissional que executa exclusivamente os novos serviços nada deve à viúva ou herdeiros do de cujus, porque completamente estranhos às novas contratações, sendo irrelevante, nessas condições, a relação pregressa do advogado falecido com os clientes agora assistidos por outro patrono.   

No que diz respeito à terceira e última dúvida da Consulente, o artigo 24, § 1º, do Código de Ética e Disciplina estabelece expressamente que “o substabelecimento do mandato sem reservas de poderes exige o prévio e inequívoco conhecimento do cliente”.

A exigência do prévio e inequívoco conhecimento acontece porque o mandante deve necessariamente saber, de antemão, quem será o substabelecido, justamente para que possa manifestar sua aceitação ou não quanto a ele, antes que efetivamente ocorra o substabelecimento sem reservas.   

Considerando que o substabelecimento sem reservas resulta em renúncia do mandatário ao mandato instituído, recomendável que o cliente seja cientificado na forma e prazo previstos no artigo 5º, § 3º, do Estatuto da Advocacia (e art. 45, CPC), isto é, seja notificado com dez dias de antecedência sobre o substabelecimento sem reservas, para que dentro desse prazo acate o procedimento, ainda que tacitamente, ou nomeie substituto. 

Logo, como o ato de substabelecer sem reservas exige a prévia e inequívoca ciência do cliente para que possa acontecer, o que, na prática, equivale, pelo menos, a um consentimento tácito em relação a quem será substabelecido, pois, do contrário, o mandante terá revogado o mandato ou indicado quem deva receber o substabelecimento, torna-se desnecessário o consentimento expresso.

Em suma, advogado que indica clientes, nas hipóteses em que isso se faz possível, não pode exigir dos colegas remuneração por isso. Nada impede, porém, que o advogado receba remuneração que lhe venha a ser voluntariamente oferecida pela indicação, vedada, em qualquer circunstância, a intermediação.

Viúva e herdeiros não têm direito de exigir percentual de honorários que venha a ser pago por clientes que foram do de cujus, junto a advogado que realiza contratação e execução dos serviços jurídicos após o falecimento do colega.

O advogado não necessita de consentimento expresso do cliente para substabelecer sem reservas, justamente porque terá de notificá-lo para que se manifeste previamente à consumação do substabelecimento, ainda que tacitamente, sobre sua aceitação ou não quanto ao substabelecido.

Esse é o voto, s.m.j.