E-4.485/2015
SÍMBOLOS PRIVATIVOS DA ADVOCACIA - DISTINTIVO DE ADVOGADO - IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO NO EXERCÍCIO DA PROFISSÃO - VEDAÇÃO LEGAL E ÉTICA - ORIENTAÇÃO QUANTO AO USO DOS SÍMBOLOS DO ADVOGADO - PRINCÍPIOS ÉTICOS DA DISCRIÇÃO, MODERAÇÃO E SOBRIEDADE
O advogado não pode, no exercício da profissão, fazer uso do "distintivo de advogado", em razão de vedações éticas e até legais, porque o documento obrigatório para essa finalidade é a carteira da OAB, e, também, porque o material contém, sem autorização, em violação a direitos, a sigla OAB, de uso privativo da Ordem dos Advogados do Brasil, e o brasão da República, símbolo oficial, de utilização restrita dos Poderes e dos Órgãos Públicos. O uso dos símbolos privativos da profissão de advogado está sempre orientado pelos preceitos éticos da discrição, moderação e sobriedade, insculpidos nos arts. 28 e segs. do CED, e também assentado no dever do advogado de proceder de forma que o torne merecedor. Os símbolos do advogado, de uso assegurado pelo inciso XVIII do artigo 7º da Lei nº 8.906/94 e regrado pelo Provimento nº 08/64 do CFOAB (influenciado pelo I.A.B.), são representados, especialmente, (I) pela figura mitológica de Têmis; (II) pela balança; e (III) pela beca. Precedentes: E-1.476/97; E-1.194/98 e E-3.048/04. Proc. E-4.485/2015 - v.u., em 19/03/2015, do parecer e ementa do Rel. Dr. SÉRGIO KEHDI FAGUNDES - Rev. Dr. CLÁUDIO FELIPPE ZALAF - Presidente Dr. CARLOS JOSÉ SANTOS DA SILVA.
RELATÓRIO - O Consulente invoca o disposto no Artigo 7º, inciso XVIII, do Estatuto da Advocacia, que cuida do direito do advogado de usar símbolos privativos da profissão de advogado, e junta aos autos cópia de modelo de material referido como “distintivo de advogado”, cujas características são o brasão da República ao centro, com a sigla da “OAB” na parte superior, e a palavra “Advogado”, na parte inferior, para formular as seguintes
Perguntas:
1). Pode o advogado, no exercício de sua profissão, em diligência, fazer uso do “distintivo de advogado”, dito vendido livremente no comércio da categoria?
2). Existe orientação sobre o uso de símbolos privativos da profissão de advogado?
Esse é o relatório.
VOTO - A consulta versa sobre ética profissional e fica conhecida para ser respondida em tese, nos termos do art. 49, do CED.
O Estatuto da OAB, no seu art. 13, indica que o documento a ser utilizado obrigatoriamente na atividade de advogado é a identidade profissional, comumente conhecida como carteira ou cartão da OAB.
Assim, a carteira da OAB é o documento oficial que distingue o advogado, de uso obrigatório no exercício de sua atividade profissional, não existindo razão, nem necessidade, tampouco amparo legal para a utilização do “distintivo de advogado” constante da consulta.
Além disso, tal “distintivo do advogado” apresenta a sigla da “OAB”, de uso privativo da Ordem dos Advogados do Brasil, a teor do art. 44, § 2º, do Estatuto da OAB.
Não há notícia de que a Ordem dos Advogados do Brasil reconheça, ou tenha autorizado o uso de sua sigla em qualquer “distintivo do advogado”, o que tornaria o material confeccionado nesse contexto, inclusive, ilegal.
Ainda, no material apresentado pelo Consulente também está inserido o brasão da República, que é símbolo oficial, de uso privativo dos Poderes e Órgãos Públicos, com utilização expressamente vedada para fins de publicidade do advogado, conforme disposto no art. 31 do CED.
Nesse sentido, já se posicionou este Tribunal Deontológico:
E-1.476 – EMENTA - SÍMBOLOS DA REPÚBLICA - UTILIZAÇÃO NOS IMPRESSOS DO ADVOGADO LIBERAL - OS SÍMBOLOS NACIONAIS SÃO DE USO PRIVATIVO DOS PODERES E ÓRGÃOS PÚBLICOS. A ORDEM, COMO ÓRGÃO REPRESENTATIVO DOS ADVOGADOS TEM FUNÇÃO PÚBLICA E, POR FORÇA DA LEI Nº. 8.906/94, ART. 44, CONSTITUI-SE EM SERVIÇO PÚBLICO, O QUE A AUTORIZA NESSE USO. JÁ OS ADVOGADOS, APESAR DE INTEGRANTES DESSA MESMA ORDEM, COM ELA NÃO SE CONFUNDEM, PORQUE A PERSONALIDADE JURÍDICA E FINALIDADE DA ORDEM SÃO DE NATUREZA PÚBLICA, AO PASSO QUE O ADVOGADO PODE SE CONSTITUIR NITIDAMENTE EM EXERCÍCIO PROFISSIONAL LIBERAL DISTINTO DOS PROCURADORES DA UNIÃO, ESTADOS E MUNICÍPIOS. INTELIGÊNCIA DO ART. 31 DO CÓDIGO DE ÉTICA E DISCIPLINA. V.U. Rel. Dr. GERALDO JOSÉ GUIMARÃES DA SILVA - Rev. Dr. CARLOS AURÉLIO MOTA DE SOUZA - Presidente Dr. ROBISON BARONI - 20/02/1.997.
E-1.694/98 -EMENTA- PUBLICIDADE - USO DE SÍMBOLOS NACIONAIS - IMPRESSOS DE SUBSEÇÃO PARA USO EM SALAS DE ADVOGADOS - EMBLEMA DA REPÚBLICA - VEDAÇÃO - É DEFESO AO ADVOGADO, OU A OUTRA INSTITUIÇÃO NÃO OFICIAL, A UTILIZAÇÃO DOS SÍMBOLOS NACIONAIS EM DOCUMENTOS DE QUAISQUER NATUREZAS, NO EXERCÍCIO PROFISSIONAIS, BEM COMO O USO INDISCRIMINADO E SEM AUTORIZAÇÃO, DOS SÍMBOLOS PRIVATIVOS DE SUA CATEGORIA. OS IMPRESSOS TIMBRADOS DE SUBSEÇÕES QUE CONTENHAM O EMBLEMA DA REPÚBLICA, NÃO PODEM E NÃO DEVEM SER UTILIZADOS EM SALAS DE ADVOGADOS, PARA A FORMULAÇÃO DE PETIÇÕES EM PROCESSOS COMUNS E NÃO VINCULADOS À ENTIDADE, OU QUE SEJAM DE SEU PRÓPRIO INTERESSE, RECOMENDANDO-SE A SUA RETIRADA URGENTE DESSES LOCAIS. V.U. do parecer e ementa do Rel. Dr. CLÁUDIO FELIPPE ZALAF – Rev. Dr. BIASI ANTÔNIO RUGGIERO – Presidente Dr. ROBISON BARONI - 18/6/1.998.
Muito embora os precedentes citados se refiram especificamente à utilização do símbolo da República em impressos, não há dúvida de que o uso de distintivo onde consta o brasão da República está igualmente vedado ao advogado, pelos mesmos fundamentos constantes dos julgados acima citados, e também por conta da interpretação dos dispositivos éticos aplicáveis ao assunto.
Isto porque, o art. 31 do CED veda expressamente a utilização de símbolos oficiais, como o brasão da República, em anúncio, ou seja, em ato do advogado de levar ao conhecimento do público um fato, o que inclui a apresentação, pelo advogado, do “distintivo de advogado”, a quem quer que seja, enquanto no exercício da profissão.
Logo, porque não há necessidade, nem adequação na utilização do “distintivo de advogado” no exercício da profissão, sua utilização está vedada ao advogado, por constituir infração legal e ética.
Quanto ao uso de símbolos privativos da profissão de advogado, merece destaque o insuperável voto do culto Conselheiro BENEDITO ÉDISON TRAMA, de leitura altamente recomendada, o qual restou assim ementado:
E-3.048/04 – SÍMBOLOS DA ADVOCACIA – A IMAGEM DA JUSTIÇA (TÊMIS), A BALANÇA, A BECA E AS INSÍGNIAS PRIVATIVAS DO ADVOGADO – RAZÕES ESTATUTÁRIAS, ÉTICAS E HISTÓRICAS DITADAS PELA NOBREZA DA ADVOCACIA – INFLUÊNCIA DO INSTITUTO DOS ADVOGADOS BRASILEIROS. Os símbolos do advogado, cujo direito de uso é assegurado pelo inciso XVIII do artigo 7o da Lei nº 8.906/94 e regrado pelo Provimento nº 08/64 do CFOAB (influenciado pelo I.A.B.), são representados (I) pela figura mitológica de Têmis – deusa grega que personifica a justiça –, equilibrada pela balança e imposta pela força da espada; (II) pela balança, que representa o mencionado equilíbrio das partes; e (III) pela beca, usada pelo profissional do direito como lembrança do seu sacerdócio e respeito ao judiciário. A presença do crucifixo nas salas de júri e dos advogados é um alerta para o cometimento de um erro judiciário que não deve ser esquecido, enquanto que a figura de Santo Ivo justifica o título de padroeiro dos advogados, pelo conhecimento de direito que detinha e por sua luta em defesa dos necessitados. O uso de desenhos, logotipos, fotos, ícones, frases bíblicas, orações ou citações célebres, ainda que eventualmente de boa estética, é vedado pelo artigo 31, caput, do Código de Ética, letras “c” e “k” do artigo 4o do Provimento nº 94/00 do CFOAB e artigo 4o da Resolução nº 02/92 do TEP “mas as insígnias que lhe são privativas devem ser ostentadas com orgulho pelo advogado”. V.U., em 21/10/04, do parecer e ementa do Rel. Dr. BENEDITO ÉDISON TRAMA – Rev. Dr. GUILHERME FLORINDO FIGUEIREDO – Presidente Dr. JOÃO TEIXEIRA GRANDE.
Extraí-se do brilhante e completo voto, à guisa de aprendizado e curiosidade, que:
“A figura de mulher, na mitologia grega, que representa a personificação da Justiça, chama-se Têmis, filha de Urano (o Céu) e de Gaia (a Terra). A espada que ela exibe representa a força de suas deliberações, enquanto que a balança significa o bom senso e o equilíbrio, além da ponderação, no julgamento das causas. Geralmente é retratada com venda nos olhos, que traduz o propósito de objetividade, nas decisões, a fim de dispensar o mesmo tratamento às partes, independentemente das condições de cada um. É ‘cega’ porque não vê a quem. Quando ela está sem a venda, o significado é outro, designa a necessidade de manter os olhos bem abertos, para que nenhum pormenor escape à sua percepção. Têmis é uma virgem, característica de incorruptibilidade, na expressão de Giorgio Del Vecchio, cujo olhar severo e absorto parece dispensar a mesma consideração às partes litigantes.
Outra figura mitológica ligada à Justiça é Minerva, também conhecida pelo nome de Palas Atena. É a deusa da sabedoria e da guerra, sendo a coruja seu pássaro favorito. É representada, por vezes, de capacete, com o escudo na mão ou sobre o peito, e a lança de guerreira. A expressão ‘voto de Minerva’ resulta da sua participação no célebre julgamento de Orestes, filho de Agaménon e Clitemnestra, acusado de matricídio, cujos juízes se dividiram no tocante à sua culpa, de maneira que o empate na deliberação do Areópago foi decidido em favor do réu, pela deusa. Na mitologia romana, a coruja e o mocho sempre estiveram associados à figura de Minerva, como imagem de sua penetrante sagacidade.
A balança é outro atributo da Justiça e representa a nivelação, no mesmo plano, das partes envolvidas no processo, assim como a espada, que lhe é acrescida, como predicado essencial desse equilíbrio e símbolo do poder, de tal modo que a balança e a espada costumam compor um único conjunto.
A beca veste talar (que desce até os pés), geralmente preta, usada à maneira de capa pelos advogados, completa a simbologia forense, como sinal do sacerdócio desses defensores do Direito e da Justiça. A respeito do significado das vestes talares, pode-se dizer que a beca, ao lado da toga, pela sua tradição e seu prestígio, é mais do que um distintivo. É símbolo. Alerta, naquele que a veste, a lembrança de seu sacerdócio, e incute no povo, pela solenidade, respeito aos atos judiciários.
Bem se vê que o “distintivo de advogado” a que se refere o Consulente, similar a distintivos utilizados por delegados de polícia e membros do Ministério Público, estes integrantes de Poderes Públicos da República, não está incluído dentre os símbolos privativos da profissão de advogado.
Certo, ainda, que o uso dos símbolos privativos da profissão de advogado está orientado pelos preceitos éticos da discrição, moderação e sobriedade, insculpidos nos arts. 28 e segs. do CED, e assentado no dever que o advogado tem de proceder de forma que o torne merecedor de respeito e que contribua para o prestígio da classe e da advocacia.
Do exposto, fica claro que o advogado não pode, no exercício da profissão, fazer uso do “distintivo de advogado”, em razão de vedações éticas e até legais, porque o documento obrigatório para a finalidade é a carteira da OAB, e também, porque o material contém, sem autorização, em violação a direitos, a sigla OAB, de uso privativo da Ordem dos Advogados do Brasil, e o brasão da República, símbolo oficial, de utilização restrita dos Poderes e dos Órgãos Públicos.
Esse é o voto.