E-3.252/05

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Tribunal de Ética e Disciplina - Melhores Pareceres

E-3.252/05 – DEPARTAMENTO JURÍDICO DE SINDICATO PROFISSIONAL – PATROCÍNIO DE ASSOCIADOS – PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE ADVOCACIA CONTENCIOSA EM GERAL – COBRANÇA DE HONORÁRIOS DE TRABALHADORES ASSISTIDOS PELO SINDICATO – IMPOSSIBILIDADE – ADVOGADO CONCILIADOR EM CÂMARA DE CONCILIAÇÃO PRÉVIA – IMPEDIMENTO E INCOMPATIBILIDADE – CAPTAÇÃO DE CAUSAS E CLIENTES – PUBLICIDADE DO DEPARTAMENTO JURÍDICO – REGRAS ÉTICAS. I - A atividade dos advogados empregados que prestam serviços aos sindicatos está restrita aos interesses coletivos ou individuais da categoria. É a regra do art. 8º, inc. III, da Constituição Federal. A pretensão de tutela jurisdicional de outros interesses que não aqueles específicos da categoria só pode ser efetivada por áreas jurídicas totalmente desvinculadas dos departamentos jurídicos dos sindicatos, devendo abster-se de estender as atividades advocatícias a todos os interesses dos respectivos associados, evitando-se a captação de clientela. II - Não pode o advogado contratado pelo sindicato, em casos de assistência judiciária para ser o patrono assistente, cobrar honorários dos empregados assistidos, mesmo em caso de êxito da ação. Também, não pode haver cobrança de honorários ou taxas de manutenção dos não associados, pois existe norma legal para o custeio das despesas. Não pode atender em nome do sindicato todos os integrantes da categoria, à exceção da assistência judiciária gratuita. A prática de dirigir a um determinado advogado essa massa de clientes constitui inculca, captação de causas e clientes e concorrência desleal, seja através de plantão nas dependências do sindicato ou em eventual escritório particular. III - Não há impedimento ou incompatibilidade no exercício da advocacia com o da função de conciliador em Câmara de Conciliação Trabalhista ou Comissão de Conciliação Prévia. Não poderá, todavia, o conciliador que participar de ações na sua comissão patrocinar, na Justiça do Trabalho ou em outra esfera do Judiciário, a causa de qualquer uma das partes envolvidas na conciliação, quer tenha havido conciliação ou não; agindo contrariamente estará infringindo a regra que veda captação de causas e clientes, mesmo após deixar de ser conciliador. IV - Publicidade em jornal do sindicato, informação de forma genérica onde o chefe do departamento jurídico fica à disposição em determinado horário, além do nome, da identificação do número de inscrição na OAB, deverá ser dirigida especificamente àqueles serviços prestados pelo sindicato na forma restrita aos interesses coletivos ou individuais da categoria, respeitando a regra do art. 8º, inc. III, da Constituição Federal, onde a pretensão da tutela jurisdicional é aquela específica da categoria, e cumprimento do art. 1º do Prov. nº 94/2000 do Conselho Federal da 0AB. . V.U., em 17/11/2005, da ementa e parecer do Relator Dr. JOÃO LUIZ LOPES – Revisor Dr. FABIO KALIL VILELA LEITE – Presidente Dr. JOÃO TEIXEIRA GRANDE.

RELATÓRIO O consulente trabalha em departamento jurídico de um sindicato profissional na região de Guarulhos, com base territorial nos municípios de Guarulhos, Arujá, Santa Isabel, Itaquaquecetuba, Poá e Ferraz de Vasconcelos, entendendo que, diante do disposto no art. 514 da CLT, letra “b”, os sindicatos têm como um dos deveres “manter serviços de assistência judiciária aos associados”, e indaga o seguinte:

“Se sendo um dever, pode ser cobrado ou não; pode haver publicação no jornal da entidade, tal qual ora acostado a título de exemplo”. Se cobrados honorários daqueles que não são sócios, pode haver retorno de parte dos honorários para a entidade sindical. Uma outra forma que se discute é a instituição de uma taxa de manutenção de 20% a favor da entidade sindical. Outra situação que tem sido discutida na entidade, inclusive, com interferência do jornalista responsável pelo jornal em anexo o qual é estudante do último ano de Direito e funcionário público federal do TRF 3ª Região, que diz que o anúncio da forma que está colocado pode, constar o nome do advogado tendo em vista que o contido está no jornal da entidade sindical e está circunscrito a uma assistência judiciária na área trabalhista e que por isso tendo em vista o artigo da CLT que fala em serviços de assistência judiciária, compreendemos que não há qualquer restrição de área, tal como indicou e sugeriu nosso jornalista. Por outro lado, a oferta, conforme disposta no Jornal, não remete a uma pretensa captação de clientela, tal qual está asseverado no código ético, porém, pode ou não a entidade sindical dizer que seu Departamento Jurídico está à disposição em determinado horário em todos os dias da semana para atendimento trabalhista, separações, divórcios, alimentos e outras ações para os sócios sem custo e para os não sócios com custo, segundo tabela existente na OAB, tendo em vista que da forma que está disposta à publicidade hoje há omissão quanto ao fato de cobrar ou não, além de indicar o nome de um colega. Pode, ainda, a entidade e ou seus advogados estabelecerem honorários quando o litígio trabalhista for levado CINTEC (Câmara de Conciliação Trabalhista no Comércio), os advogados conciliadores, junto a CINTEC de Guarulhos e Itaquaquecetuba, quando os acordos são infrutíferos lamentavelmente nos pegamos atuando como advogado daquele caso que passou pela CINTEC, ressalvando que na CINTEC atuamos como conciliador (pessoa física) e não como advogado”.

Foi juntado à consulta um “folder” do sindicato onde se lê “Direitos trabalhistas”, letras na cor vermelha, e a expressão “O Sindicato dos Empregados no Comércio de Guarulhos dispõe de advogados especializados para atender os comerciários, orientá-los e defendê-los nas questões judiciais” (fls. 5), e um exemplar do jornal  O Comerciário de setembro de 2005, onde se vê, na página 2, um quadro  onde se lê “O departamento jurídico sob o comando do Dr. J. B. está à sua disposição, de segunda a sexta-feira, das 9h às 17h. - HOMOLOGAÇÕES - As homologações no sindicato são feitas das 9 às 17:30 hs e devem ser marcadas com 2 dias de antecedência. Em Guarulhos, Arujá e Santa Isabel - Ligue (11) ...Em Itaquá, Poá e Ferraz, Ligue (11) ... e ...”.

 

PARECER – O texto legal contido na letra “b” do art. 514 da CLT prescreve que é dever dos sindicatos manter serviços de assistência judiciária para os associados, independentemente do salário que percebam. Todavia, no âmbito da Justiça do Trabalho, a assistência judiciária tem regramento próprio, consoante disposição da Lei nº 5.584, de 26 de junho de 1970, que no seu art. 14 faz referência à assistência judiciária a que se refere a Lei nº 1.060, de 05 de fevereiro de 1950, conhecida como a lei da concessão de assistência judiciária, e nesse artigo 14 está devidamente delimitado que a assistência judiciária deve ser prestada pelo sindicato àqueles que não tenham condições de ingressar com ação, sendo devida a todo aquele que perceber salário igual ou inferior ao dobro do mínimo legal, ficando, também, assegurado igual benefício ao trabalhador que tiver salário superior, desde que comprove que a sua situação econômica não lhe permite demandar sem prejuízo do sustento próprio ou da família. Essa assistência será prestada ainda que o trabalhador não seja sócio do sindicato (art. 18 da Lei nº 5.584). Além dessa assistência judiciária no âmbito da Justiça do Trabalho, o sindicato dos trabalhadores presta assistência nas rescisões dos empregados com mais de um ano de emprego (art. 477 da CLT) e dos empregados estáveis demissionários (art. 500 da CLT).

O art. 592 da CLT revela que a receita obtida pelo sindicato com a contribuição sindical deverá ser aplicada em parte na assistência judiciária, no âmbito da Justiça do Trabalho. Diante dessas determinações legais, não é possível, na medida em que se afigura flagrantemente antiético, cobrar qualquer valor a qualquer título, muito menos serem cobrados honorários daqueles que são e que não são sócios.

A questão de cobrança de taxa de manutenção de 20% por parte do sindicato, desde que não se vincule como honorários advocatícios aos advogados do sindicato, é problema que não está afeto ao exame em matéria de ética profissional do advogado, porque está envolvendo a classe dos empregados no comércio e o próprio sindicato da categoria.

O “folder” de fls. 5 tem flagrante conotação com captação de clientela, na medida em que não especifica de forma clara que a orientação e defesa devem ser somente para as questões de direito do trabalho, ou seja, trabalhistas, mas, como não está identificado se é advogado que insere tal publicidade, o caso deve ser levado à esfera da Comissão de Prerrogativas, uma vez que o sindicato está extrapolando as suas funções e invadindo o campo da atuação profissional do advogado e com isso praticando profissão ilegal.

Ao contrário do que possa parecer ao consulente, a assistência judiciária que dispõe o art. 514, letra “b”, da CLT, combinado com as disposições da Lei nº 5.584/70 nos arts. 18 e seguintes, deve ficar restrita à Justiça do Trabalho, mesmo porque, em havendo condenação em sucumbência, a teor do disposto no art. 16 da Lei nº 5.584/70, os honorários advocatícios reverterão em favor do sindicato. A assistência judiciária nos demais ramos do direito deve observar os ditames dos serviços de assistência judiciária organizados e que são ofertados pela PGE em convênio com a OAB, centros jurídicos das faculdades de direito e pela própria OAB.

Nesse sentido convém lembrar outras decisões deste sodalício, que entendeu ser a atividade de advogado de sindicato restrita aos interesses coletivos e individuais da categoria, devendo sempre se abster de estender as atividades advocatícias a todos os interesses dos respectivos associados, pois, do contrário, estará captando clientela, infração ética prevista no art. 7º do CED. O advogado do sindicato deve,ainda, abster-se de atender empresas pertencentes ao setor, associadas ou não.

Não obstante isso, sendo os advogados empregados dos sindicatos de classe, que representam empregados ou empregadores daquela cidade ou região e que prestam serviços de consultoria jurídica e de assessoria administrativa e jurídica aos associados, que procuram orientação jurídica e até trabalho afeto ao contencioso, deve ser observada a regra ética que este Tribunal já se posicionou várias vezes em relação aos departamentos jurídicos dos sindicatos, no sentido de que seus advogados devem atender aos associados nos interesses específicos da classe por eles representada e não estender suas atividades a todos os interesses dos respectivos associados. Nesse sentido é a ementa contida no processo nº E-1632/97, da lavra do Dr. Carlos Aurélio Mota de Souza, que define perfeitamente a forma de atuação que deve ser utilizada, para evitar o ferimento da ética.

No que concerne à cobrança de honorários de trabalhadores assistidos pelo sindicato, este sodalício já decidiu em recente decisão que “Nos casos de assistência judiciária gratuita, não pode o advogado, contratado pelo sindicato para ser o patrono assistente, cobrar honorários de êxito dos empregados assistidos” e mais “constitui inculcação, captação de causas e clientes e concorrência desleal dirigir determinada massa de clientes para um determinado advogado, seja através de plantão nas dependências do sindicato, seja em seu escritório particular. Vedação ética e passível de correção disciplinar. Sempre que tomar conhecimento dos advogados que já estejam praticando infrações deve o Presidente da Seccional chamar a atenção para o dispositivo violado e instaurar o competente procedimento para apuração das infrações e aplicação de penalidades” (Proc. E-3.181/05).

As comissões de conciliação prévia estão normatizadas pelos arts. 625-A a 625-H da CLT e, examinando esses dispositivos legais, em nenhum deles encontramos que essas comissões de conciliação ou os núcleos intersindicais de conciliação trabalhistas podem cobrar custas, despesas e muito menos honorários advocatícios. Portanto, os advogados que fazem parte como conciliador nessas comissões ou nos núcleos sindicais de conciliação prévia não podem estabelecer tabelas ou pleitearem honorários advocatícios, quando o litígio for levado à apreciação nessas comissões e, no caso específico, à Câmara de Conciliação Trabalhista no Comércio.

Quanto à questão posta sob consulta, do advogado ser conciliador e, ao depois, ser advogado de uma das partes que esteve na câmara ou na comissão de conciliação, este sodalício firmou entendimento pacífico de que não há impedimento ou incompatibilidade com o exercício da advocacia e o da função de conciliador em comissão de conciliação prévia. Todavia, não é ético, portanto, sujeito às penas previstas no CED, o conciliador participar de ações da comissão, câmara ou núcleos de conciliação prévia e patrocinar depois, na Justiça do Trabalho ou em outra esfera do Judiciário, a causa de qualquer das partes que se conciliaram ou não. Em assim agindo, estará infringindo a regra da captação de clientela. (Precedente: processo nº E-2.514/02).

Assim, o advogado que funcionou como conciliador, quer nas comissões de conciliação prévia, quer nos núcleos intersindicais de conciliação prévia ou na câmara de conciliação trabalhista dos sindicatos da categoria, não pode em hipótese alguma patrocinar qualquer causa, quer na Justiça do Trabalho, quer em outra esfera do Judiciário, como advogado das partes envolvidas, quer tenha havido ou não conciliação, sob pena de inculcação, captação de causas e clientes e concorrência desleal e, mesmo depois de deixar tal função, não poderá representar, patrocinar ou defender interesses daquelas partes envolvidas na conciliação, onde o causídico foi o conciliador, sob pena de infringir os arts. 7º, 20 e 25 do CED e art. 31 do EAOAB.

A informação, que mais parece uma publicidade (fls. 06) na forma em que está contida no jornal O Comerciário, onde informa que o departamento jurídico sob o comando do Dr. J. B. “está à sua disposição de segunda a sexta-feira, das 9h às 17H”, desde que esclarecendo para os fins a que se destina, ou seja, de orientação no âmbito da Justiça do Trabalho, que é a função do sindicato, não nos parece que, com essa ressalva, possa ferir os preceitos éticos, responsabilizando-se, todavia, o advogado que comanda o departamento jurídico do sindicato pelas informações inadequadas e que possam gerar captação de clientela, e em qualquer hipótese essas orientações não podem ser cobradas na medida em que, conforme já foi relatado, os custos e despesas devem ser sempre arcados pelo sindicato, que, para isso, possuem pela lei própria a verba da contribuição sindical para fazer frente a tais despesas.