03 de outubro de 2023 - terça

Para crescer na carreira de comunicação, o diploma não basta

Para Fernanda Lara, CEO do I'Max, só a inquietação leva o profissional para frente em um segmento que muda tão rápido

 

Se pudéssemos escolher uma metáfora imagética sobre a relação que nós, comunicadores, temos com a comunicação hoje seria a cena de um sujeito tentando subir num carro em movimento - ou descer, a depender do grau de motivação no qual você, meu colega de profissão, se encontre. 

Sim, estamos vivendo uma corrida maluca. Este é um fato incontestável. Assim como parece não haver dúvida de que este carro anda meio desgovernado. Tem gente com desânimo para subir; outros com desespero para descer. Não está fácil empreender em comunicação. 

No jornalismo, o antigo modelo de negócios minguou e não há outro prontinho para colocar no lugar. Estamos em teste e muitas novas tentativas não resistem ao soft opening. 

Ao mesmo tempo, a publicidade nunca mais será a mesma, como nos disse o professor Carlos Alberto Di Franco nesta matéria, e a comunicação corporativa vive seu tempo de ebulição, com faturamento recorde, mas com dificuldades para dar conta de tantas necessidades das marcas. 

Equipes se desdobram para entender um universo de inovações tecnológicas e de narrativas necessárias aos novos tempos. E que tempos, senhores! Tudo muda o tempo todo. A gente que lute!

Não estou livre das angústias que nos levam a ter que pensar no futuro quando o presente é também uma incógnita. Mas confesso que um pouco de digressão às vezes faz bem. Dou umas voltinhas ao passado para lembrar o que de fato me fisgou quando decidi ingressar no mercado de comunicação. Faz bem visitar a Fernanda do passado e lembrar que toda época tem seu glamour e seu perrengue. Inclusive esta.

Se você tem mais de 40 anos, ainda pegou fax cuspindo ocorrências de delegacias em redações de jornais grandes. Muitos releases chegavam por lá, mesmo quando já existia e-mail. Pesquisas em CEDOCs físicos conviveram com a Wikipedia e as buscas no Google; xerox com scanner, idem. Mas gente e robô dividindo a produção de conteúdo talvez seja demais até pra nós - ainda que muita gente caia só com o barulho da bala.

Lá atrás, fiz jornalismo porque queria fugir da pressão brasiliense para fazer concurso público. Também queria estudar na Universidade de Brasília, mais precisamente em um campus que se confundia com a cidade. Sou fruto de uma capital inventada, ou seja, de um exercício de futurologia esplêndido, que se concretizou. E esse feito parece contaminar os nascidos em Brasília. A gente se permite viver uma casinha à frente. 

Logo cedo, percebi que o jornalismo que eu aprendia na faculdade não ia me prender ou pelo menos ditar os rumos do meu futuro profissional. Depois de uma passagem por estágios em redação e numa agência de comunicação corporativa, tive certeza de que havia algo mais. Fui para Grenoble, na França, cursar um ano da minha graduação, quando tive os primeiros contatos com empreendedorismo e startups. 

Grenoble é como se fosse uma “mini Palo Alto” no meio da Europa. Um ambiente universitário que respira novos negócios. Lá tem um dos maiores centros politécnicos da Europa e também um respeitado curso de pós-graduação em Marketing. Juntou tecnologia com quem pensa em vendas e, ouvindo os colegas, comecei a encarar coisas muito futurísticas com mais naturalidade.

Entendi ali que não é um curso superior que define nosso futuro profissional. A faculdade, salvo raros casos em que a técnica é de vida ou morte, serve para você experienciar um tempo, pensar em que tipo de pessoa você quer se tornar realmente, ganhar repertório e referência. A inquietação nos define mais do que a profissão.  

Foi essa inquietação e o aprendizado contínuo, ao longo da vida, que me ensinaram que a gente sempre deve se perguntar como fazer diferente. Fundei o I’M Press quando tinha 24 anos e o Maxpress já era minha referência de empresa bem-sucedida em tecnologia para a área de comunicação. E eu, ansiosa e sofrendo para empreender, achava que aquela era uma realidade distante.

O Maxpress criou o mailing de imprensa antes mesmo da internet e eu sonhava ser um dia tão relevante como eles no mercado. Um dia, Decio Paes Manso, fundador do Maxpress, me chamou para conversar. Queria me conhecer. Parecia um sonho. Desde o início, nos demos bem e concordamos que aquele era um mercado que ia se transformar. 

A gente já falava sobre como a comunicação corporativa ia se distanciar cada vez mais da caixinha de assessoria de imprensa para oferecer soluções completas de public relations, o que de fato aconteceu. 

Um executivo de comunicação corporativa hoje faz mais do que somente intermediar pautas: produz conteúdo para e sobre o cliente, atua como consultor de imagem, preserva a reputação, propõe eventos, antecipa tendências, ou seja, faz muito mais do que antes.

Em 2019, nossas empresas se fundiram e eu me tornei a CEO do I’Max, função que não me cega os olhos. O fato de ser líder nesse mercado não é maior que a minha inquietação. Porque, de novo, ela é o que me define. Não a empresa, não a profissão, nem a carreira. 

Temos que pensar que o cliente quer soluções, independentemente de onde elas surjam. Não me permito correr atrás, mas na frente
Talvez falte essa inquietação no jornalismo, sobretudo. Vejo pequenos querendo copiar modelos de negócios dos grandes, como se qualquer um tivesse vocação para ser um New York Times, que acaba de divulgar um balanço bem positivo. 

O modelo de pagamento por notícia on-line não funciona no Brasil como lá fora e, se for pura cópia, só vai enforcar cada dia mais nosso jornalismo. Ninguém mais quer clicar num link da bio e ser levado para uma página de assinatura. Não vai funcionar - ou pelo menos não tanto quanto se espera. As pessoas pagarão por conteúdo? Sim, se ele for bom, mas não serão tantos assim, e tudo deve ser exclusivíssimo.

Acho que há um espaço enorme para a produção de notícias especializadas se pararmos de olhar a audiência como um monobloco. Volume não é o único caminho de rentabilizar; personalização é o que gera valor. Essas são algumas das minhas crenças.  

Torço para que os estudantes não encarem a faculdade como uma fábrica de ofício e sim um lugar para explorar um mundo de possibilidades, criar coisas novas e deixar uma marca pessoal. Torço para que os profissionais experientes consigam sair da mesmice de uma redação estagnada com um sopro de vontade por algo novo e único.


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