De Frente com o TED

13 de maio de 2025 - terça

Gravação de atos judiciais e extrajudiciais pelo advogado: ética e prerrogativas

A gravação de atos advocatícios exige análise ética para equilibrar transparência e deveres profissionais


Maria Carolina Nunes Vallejo
Relatora da 1ª Turma do TED OAB SP

A gravação de atos judiciais e extrajudiciais pelo advogado é um tema que suscita debates no meio jurídico.

O Código de Processo Civil (CPC), em seu  artigo 367, parágrafo 5º, estabelece a possibilidade de as audiências serem integralmente gravadas. A Recomendação nº 94/2021 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aos tribunais é a gravação de todos os atos processuais, presenciais ou virtuais, para aprimorar a eficiência e garantir a transparência.

O parágrafo 6º do referido artigo 367 do CPC, estabelece que a gravação de audiências é legalmente permitida por qualquer das partes, não se exigindo autorização judicial ou da autoridade que preside o ato.

No precedente E-5.875/2022, a Primeira Turma do Tribunal de Ética e Disciplina (TED) da OAB SP expressou que o direito à gravação é uma conquista da advocacia e da cidadania, pois ocorrem situações em que as prerrogativas profissionais acabam sendo ofendidas e a defesa de clientes acaba também prejudicada.

Respondendo à consulta da Comissão de Prerrogativas da OAB SP, a Primeira Turma, no Processo E-6.112/2023, novamente explicitou que não há infração ética na gravação pelo advogado, desde que esteja vinculada ao exercício profissional e à defesa dos interesses do cliente. 
O precedente destaca, ainda, que a prerrogativa se estende a qualquer ato processual, pré-processual ou extrajudicial no qual o advogado esteja atuando em nome do cliente, exceto conciliações. Modificando a posição anterior da Primeira Turma, estabelece que o ato ostensivo da gravação, é apenas uma recomendação:
 

EXERCÍCIO PROFISSIONAL – GRAVAÇÃO DE AUDIÊNCIAS – POSSIBILIDADE LEGAL – INEXISTÊNCIA DE INFRAÇÃO ÉTICA 
Por imperativo do exercício de sua função, que é indispensável à administração da justiça, não há por que privar o advogado, na representação das partes, do exercício do direito de documentar os depoimentos e atos correlatos no decurso da audiência. À luz da interpretação literal da lei processual, não constitui infração ético-disciplinar a gravação de audiência de instrução em imagem, áudio, mídia digital ou outro meio analógico. (artigo 367, §§ 5º e 6º do CPC). A permissão de gravações por parte do advogado, nos limites dos deveres que lhe são impostos na defesa das prerrogativas profissionais, não é apenas para a gravação das audiências de instrução, com restrição às de conciliação, mas para todo e qualquer ato processual, pré-processual ou extrajudicial, que o advogado deva praticar no exercício da profissão e na defesa dos interesses do cliente, independente de autorização judicial ou da autoridade que preside o ato. Do ponto de vista ético, recomenda-se que o ato da gravação há que ser ostensivo, pelo dever da lealdade com que deve ser pautada às relações processuais e as relações entre advogados. O ato ostensivo da gravação, é apenas uma recomendação, e não uma imposição, pois na lição do artigo 31º e seus parágrafos do EAOAB, o advogado, no exercício da profissão, deve manter independência em qualquer circunstância, e não deve ter nenhum receio de desagradar o magistrado ou qualquer autoridade. Precedentes Proc. E-3.854/2010, E-3.986/2011 e E-4.987/2018. Proc. E-6.112/2023 - v.u., em 09/11/2023, parecer e ementa do Rel. Dr. LUIZ ANTONIO GAMBELLI, Rev. Dr. FÁBIO TEIXEIRA OZI, Presidente Dr. JAIRO HABER.


Quanto às conciliações, o CPC as regulamentou em capítulo específico, prevendo a confidencialidade no seu artigo 166. Na mediação, o dever de confidencialidade alcança, o mediador, as partes, prepostos e todos os que tenham participação no ato, a teor da Lei 13.140/2015. Salvo se as partes dispuserem de forma diversa, nenhuma informação relativa à mediação poderá ser usada em processos arbitrais ou judiciais.

Segundo o já citado parecer E-5.875/2022, a gravação de audiências e sessões de conciliação e mediação não é eticamente razoável, porque o intuito é que as partes possam ter uma conversa mais franca e direta sem a presença do julgador, e a gravação poderá eventualmente inibir as partes:
 

EXERCÍCIO PROFISSIONAL - AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO E MEDIAÇÃO - GRAVAÇÃO – IMPOSSIBILIDADE. Os objetivos buscados com a mediação e conciliação, judiciais ou extrajudiciais, ou mesmo em reuniões informais para esse fim entre advogados, com ou sem as partes, são contrários a que se faça gravações, sob pena de transformar o ato em busca de provas ou investigação de fatos. Assim, no caso de audiências de conciliação, não é eticamente aconselhável a gravação de audiências, porquanto poderá inibir o intuito das partes, confrontando o princípio conciliatório que deve buscar a advocacia, recomendando-se, caso haja o desejo de gravação, seja ele ostensivamente sugerido ao início da audiência, para que se faça constar a eventual concordância das partes no termo respectivo. Sem a concordância dos presentes, inviável eticamente a gravação. (Precedentes: E-4.987/2018, E-3.854/2010, E-3.986/2011). Proc. E-5.875/2022 - v.u., em 18/08/2022, parecer e ementa do Rel. Dr. CLÁUDIO BINI, Revisora – Dra. MARIA CAROLINA NUNES VALLEJO - Presidente Dr. JAIRO HABER
 

A proteção das informações contidas nas gravações é essencial para preservar a confiança entre advogado e cliente, a integridade do processo judicial e o sigilo profissional. A divulgação indevida do conteúdo gravado pode configurar violação de deveres éticos, resultando em sanções disciplinares.

A gravação de atos judiciais ou extrajudiciais, quando realizada dentro dos limites éticos, é instrumento legítimo e necessário à atuação da advocacia. A tentativa de restringir esse direito configura afronta direta à dignidade da profissão e à própria função constitucional do advogado.

Outros importantes precedentes da Turma Deontológica (Processos E-3.854/2010, E-3.986/2011, E-4.548/2015 e E-4.987/2018), tratam da questão das gravações e reafirmam a posição da Ordem em defesa intransigente das prerrogativas da advocacia, ao mesmo tempo em que ressaltam a importância da ética como pilar do exercício da advocacia.
 


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