A OAB SP (Ordem dos Advogados do Brasil Seção São Paulo), por meio da Comissão de Igualdade Racial, com apoio da AASP (Associação dos Advogados de São Paulo), o IASP (Instituto dos Advogados de São Paulo) e o IBCCRIM (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais), realizou, nesta quinta-feira (24), na sede da AASP Unidade Centro, o primeiro dia do Congresso Nacional de Juristas Negras Vozes de Julho: Tecendo a Justiça - Atuação de Juristas Negras na Construção de Direitos, Potência e Transformação Social. A iniciativa tem como proposta celebrar o mês da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, bem como a trajetória de resistência e a contribuição de mulheres negras para a construção da justiça social no Brasil.
Na mesa de abertura: ‘Justiça em Movimento: Entidades por um Sistema Antirracista’, a vice-presidente da OAB SP, Daniela Magalhães, mencionou a responsabilidade de usar seu privilégio para lutar contra o racismo e promover transformação social, reafirmando o papel e compromisso da Ordem, além de ações e iniciativas efetivas realizadas pela Secional paulista: “O racismo só vai ser superado se seguirmos juntas, e se as entidades estiverem juntas. Enquanto pessoa, mulher, privilegiada que sou, eu penso que temos essa obrigação de usar o nosso privilégio, as nossas redes, os nossos contatos, para enfrentar a dor e injustiça que o racismo causa. Precisamos garantir que essa entidade aplique e leve adiante as mudanças estruturantes necessárias”, pontuou.
Primeira presidente negra eleita da CAASP (Caixa de Assistência dos Advogados de São Paulo), Diva Zitto trouxe como referência o papel de mulheres negras que fizeram história e abriram caminhos para outras ocuparem seus lugares de direito: “Estamos rompendo padrões e chegando a alguns lugares onde antes não nos era permitido sequer sonhar em estar. Nós sabemos o quão difícil é estarmos nesses espaços. E, hoje, nós temos a possibilidade de não estarmos mais sozinhas. Resistência é o nosso sobrenome. Se estamos aqui hoje, é porque as nossas lá de trás resistiram” disse emocionada.
A mesa ainda teve as presenças da presidente da AASP, Renata Castello Branco; da ministra do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Edilene Lôbo; da vice-presidente do IASP, Marina Coelho; da vice-presidente do IBCCRIM, Carina Quito, e da professora e advogada Eunice Prudente.
Lideranças negras transformando o Judiciário
O painel de abertura do Congresso reuniu vozes potentes do cenário jurídico nacional para refletir sobre a presença negra em espaços de poder, o papel da mulher negra na construção da justiça e a urgência de práticas antirracistas no sistema jurídico brasileiro. A advogada e professora Eunice Prudente traçou um panorama histórico das lutas por direitos no âmbito jurídico, ressaltando o papel da advocacia e da OAB na promoção da dignidade e dos direitos fundamentais. Já a ministra do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Vera Lúcia Santana, destacou as iniciativas de resistência, relacionando-as com a luta histórica de figuras como Maria Felipa, Dandara e Luiz Gama, e reforçou: “nós somos a continuidade dessa história”, que a luta segue sendo coletiva e que “ainda existe ausência e não presença” nos espaços de poder .
Edilene Lôbo, ministra do TSE, trouxe à tona a importância da memória e da reconstrução de narrativas históricas, exaltando figuras como Tereza de Benguela e Conceição Evaristo. Questionou a ideia de uma democracia racial e política plenamente efetivada, defendeu que a presença de mulheres negras no Judiciário é um dever institucional, não um favor, e que a luta deve ser coletiva, com compromisso com as populações historicamente excluídas. Citando Lélia Gonzalez, reforçou a importância de alternativas coletivas e do feminismo negro como ferramenta de transformação. Viviane Scrivani, secretária-geral adjunta da OAB SP, ficou com a mediação da mesa.
Ascensão das Juristas Negras
Com foco no resgate histórico e na construção coletiva de caminhos, o segundo tema do dia, conduzido pela advogada Ana Carolina Lourenço, apresentou reflexões importantes sobre o legado das mulheres negras no Direito, partindo da referência de Esperança Garcia, reconhecida como a primeira advogada do Brasil, até as atuais conquistas e desafios enfrentados pelas juristas negras nos espaços institucionais.
Camila Torres, vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB SP, refletiu sobre a vivência da mulher negra no Direito. Karolina Manoel, advogada, relembrou que a ancestralidade não é apenas o passado, mas também o caminho que se deseja trilhar, e que a conquista da voz no jurídico deve ser fluida, consistente e consciente de quem abriu os caminhos. Patrícia Anastácio, conselheira da AASP, compartilhou sua trajetória, ressaltando os avanços e as mudanças que vêm sendo conquistadas. Viviane Scrivani, secretária-geral adjunta da OAB SP, reforçou a importância da construção coletiva do legado das mulheres negras. Ressaltou que o que se planta hoje, com trabalho, união e luta, poderá florescer em transformações sociais profundas: “Temos uma advocacia que precisa ser ouvida”.
Protocolo para a equidade racial
O terceiro painel, que trouxe reflexões profundas sobre a urgência de protocolos antirracistas que garantam equidade racial no sistema de Justiça, contou com mediação da vice-presidente da Comissão de Justiça Restaurativa da OAB SP, Claudia Patricia de Luna Silva, e participações da presidente da Comissão de Igualdade Racial da OAB SP, Rosana Rufino, da advogadas Helena Pontes dos Santos e da juíza federal do TRF3, Daldice Santana.
Criminalização da Desinformação e Liberdade de Expressão
A discussão reuniu as advogadas Anamaria Prates, Priscila Pamela e Luanda Pires, com mediação da vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB SP, Camila Torres, para discutir os desafios jurídicos e políticos da criminalização da desinformação e dos discursos de ódio nas redes sociais. Foram abordadas as fragilidades da democracia diante da disseminação de conteúdos discriminatórios, a importância de reconhecer o sofrimento social causado pelo preconceito e a necessidade de estruturas jurídicas eficazes para combater crimes de ódio.
Direito Penal, combate à corrupção, racismo estrutural e acesso à saúde
Em ‘Direito Penal e Novas Estratégias de Combate à Corrupção: Aspectos preventivos e integridade’, foram abordadas estratégias inovadoras no enfrentamento à corrupção, com ênfase na prevenção e na promoção de uma cultura de integridade no setor público e privado. As advogadas Alana Guimarães Mendes e Claudia Barrilari participaram do painel, com mediação da presidente da Comissão de Igualdade Racial e Gênero da OAB Pinheiros, Diumara Araújo.
Finalizando o primeiro dia de Congresso, o painel ‘Determinantes Sociais da Saúde, Racismo Estrutural e o Acesso Desigual à Saúde: Desafios para o Direito Médico na Promoção da Equidade Racial no Brasil’ reuniu especialistas para discutir como o racismo estrutural impacta o acesso à saúde e quais os desafios enfrentados pelo Direito Médico na construção de um sistema mais justo e equitativo. As advogadas Graziela Costa, Isabela Damasceno e Lenny Blue de Oliveira abordaram os determinantes sociais da saúde, a invisibilidade da população negra nos serviços de saúde e a urgência de políticas públicas interseccionais. A mediação ficou a cargo da advogada Ana Lucia Santos.
O evento continua até sexta-feira (25), a partir das 9h, na sede da OAB SP, e ainda contará com a premiação da medalha Tereza de Benguela. Mais informações, pelo link.